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Livros
Sábato Magaldi revisita crítica em livro
O crítico lança compilação de textos, alguns inéditos, e guarda anotações em 48 cadernos que só virão a público após sua morte
"Teatro Sempre" reúne 29 textos, incluindo análises e comentários sobre
dramaturgos como Oswald de Andrade e Dias Gomes
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Para Décio de Almeida Prado
(1917-2000), cânone da reflexão teatral no país, "o crítico
ideal talvez seja aquele que deixou de escrever e do qual só
subsistem as qualidades na memória generosa de seus admiradores".
Sábato Magaldi, 79, torce para que seja assim lá pelos 30
anos depois de sua morte,
quando, supõe, poderiam ser
publicadas as suas "Crônicas da
Vida Teatral". Já são 48 os cadernos, de cerca de 400 páginas
cada um, em que desde os anos
60 ele aponta à caneta bastidores da classe teatral -ou seja
"aquilo que não dá para publicar no jornal".
"São anotações que podem
ajudar a esclarecer porque determinado artista fez isso ou
aquilo em sua carreira. Às vezes, são situações chatas de trazer a público. Como o sujeito
que é casado com uma atriz,
briga e se casa com outra, isso
se reflete em seu trabalho", diz.
Enquanto guarda o projeto a
sete chaves, alimentando-o de
quando em quando, o crítico,
historiador, professor aposentado da USP e membro da Academia Brasileira de Letras revisita ensaios ou textos para palestras, alguns inéditos, escritos nas últimas cinco décadas.
É o que se lê em "Teatro Sempre", lançamento da coleção
Estudos da editora Perspectiva
e prolongamento do livro "Depois do Espetáculo" (2003), em
que o autor já compilava artigos
sob igual recorte.
Agora, são 29 textos variados,
sobretudo análises e panoramas históricos. Consta, por
exemplo, uma rara entrevista
com o comediógrafo Silveira
Sampaio (1914-64), feita em
1956, exposição de face pouco
conhecida pelas novas gerações
do Magaldi noticiarista, como
se dizia, repórter do "Jornal da
Tarde" (1962-88) e do "Suplemento Literário" (1956-67) de
"O Estado de S. Paulo".
O arquivo pessoal guarda entrevistas com personalidades
como o ator Sérgio Cardoso
(1925-72) e o filósofo francês
Jean-Paul Sartre (1905-80),
matéria-prima garantida para,
quem sabe, um compêndio de
encontros notáveis.
Sempre atento ao "lugar da
palavra no teatro" (Artur Azevedo, Qorpo-Santo, Oswald de
Andrade, Ariano Suassuna,
Dias Gomes, Jorge Andrade,
Oduvaldo Vianna Filho, Plínio
Marcos e Augusto Boal são alguns dos dramaturgos que ganham comentários à parte),
"Teatro Sempre" acolhe ainda
uma crítica de uma produção
contemporânea. Trata-se de "A
Falecida", de Nelson Rodrigues, na montagem carioca de
Gabriel Villela feita em 1994.
"Nelson Rodrigues marcou os
principais personagens da peça
com o estigma da frustração.
[...] O pessimismo do dramaturgo não é, porém, silencioso,
e Gabriel Villela soube torná-lo
gritante, feérico, hiperbólico."
Réplica
Magaldi diz que raramente
suas críticas eram replicadas.
Houve uma polêmica histórica
com José Celso Martinez Corrêa, que dirigiu a criação coletiva "Gracias, Señor" no teatro
Oficina, em 1972. "Achei que a
idéia era boa, mas ele não tinha
sido feliz na realização. É justo
que a pessoa fique furiosa. Passa meses preparando, então
vem o chato do crítico e faz comentário destruindo o trabalho; é mais que razoável que a
pessoa fique louca da vida."
Trecho da "Carta aberta a Sábato Magaldi, também servindo para outros, mas principalmente destinada aos que querem ver com olhos livres", como intitulou Zé Celso:
"Olha, Sábato, a única maneira de você escrever sobre esse
trabalho era fazendo uma viagem na tua função social de crítico. Pois lá, na sala onde você
esteve não estando, era só nisso
que pensávamos quando te
olhávamos. Era na pessoa atrás
do terno e gravata e da risada de
sala de visitas mineira. Nós o
amamos muito naquele momento e sentimos todas as suas
couraças, mas você não quis
deixar o seu dever profissional
-o tiro saiu pela culatra."
Em seus escritos, Magaldi toma cuidado em ressalvar que,
às vezes, poderia ter sido mais
vertical em um ponto ou outro,
lacuna a ser preenchida por demais pesquisadores. "Faço uma
contribuição que outros também vão dar. A soma de tudo vai
propiciar, inclusive, que se realize uma boa história do teatro
brasileiro", afirma. E exercita a
autocrítica: "Fiz um "Panorama
do Teatro Brasileiro" [1962 e
1997] que acho que tem seu lugar, mas está longe de ser aquilo o teatro brasileiro exigiria."
Magaldi recupera-se de uma
queda sofrida semanas atrás,
quando tropeçou numa dessas
bolas de metal plantadas na calçada para que carros não estacionem, à custa das canelas
alheias. A dor diminuiu e possibilitou sua ida a Curitiba na semana passada. Num encontro
com universitários, declarou:
"Sei, pelo estudo da história
do teatro, que os críticos muitas vezes se enganaram, e provavelmente me incluo entre
eles, embora não recorde nada
de que deva me arrepender. É
que julgo o amor pelo teatro e a
boa fé as qualidades primeiras
da função de crítico."
TEATRO SEMPRE
Autor: Sábato Magaldi
Editora: Perspectiva
Quanto: R$ 40 (248 págs.)
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