São Paulo, quinta-feira, 21 de outubro de 2010

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OPINIÃO LEGIÃO URBANA

Força do grupo é sua poesia fácil e encantadora que dispensa o rock

THALES DE MENEZES
EDITOR-ASSISTENTE DA SÃOPAULO

Brasileiro adora violão.
A MPB foi construída em cima do instrumento. Samba, seresta, moda caipira, bossa-nova, João Gilberto, Chico Buarque, seguindo, hoje, até uma Ana Carolina.
Renato Russo era poeta. E adorava um violão.
Entre os representantes do rock brasileiro nos anos 1980, a Legião Urbana era a banda "menos rock". Sua música fala de amor, seja sublime ou cotidiano, sem precisar de pedal de distorção.
Enquanto os outros meninos de Brasília pediam guitarras e teclados de Natal, o jovem Renato era o "freak" do violão, essa figurinha conhecida em muitos colégios por aí. Aquele tipo que gosta do Lô Borges, do Vandré.
Legião Urbana era MPB?
Não. Seria fácil imaginar Renato Russo sentado num banquinho e dedilhando "Pais e Filhos" ou "Eduardo e Mônica" em um dos festivais da Record. Dispensar a moldura rock dos discos da Legião não causaria dano algum à letra ou à melodia.
Mas Renato estava impregnado de cultura pop e rock. A cada faixa, sua banda passava atestado claro de influências. Podia soar como U2, Smiths ou Neil Young, sem nenhum pudor.
Não poderia, então, ser MPB. Era mais. De modo grosseiro, é possível colocar Renato Russo perto da intersecção entre Chico Buarque e Bob Dylan. Tem do primeiro o refinamento poético, a carpintaria da palavra. Do segundo, a missão de tocar as pessoas e o total desprezo pelo refrão e pela rima fácil.
Para que se preocupar com um refrão descolado se a força quase cinematográfica das letras faz todo mundo querer decorar os 168 versos de "Faroeste Caboclo"?
Legião faz sucesso com gerações contínuas por três motivos: encantamento, identificação e acessibilidade.
As letras encantam, literalmente. Renato Russo tinha a sensibilidade de tratar temas que, mais do que adolescentes, falam do que sobra da adolescência pelo resto da vida, como a vocação para amar errado ou a certeza de não se encaixar no mundo.
A identificação do público com o cantor é intensa. Como o próprio Renato insistia em dizer, se alguém morando no cerrado e feioso como ele pode se transformar em astro pop, você também pode.
E o universo musical da Legião é facilmente acessível a todos, bom de cantarolar, pelo formato despojado.
Reproduzir no quarto ou na garagem as músicas de "Cabeça Dinossauro" ou "Selvagem?" requer equipamento e iniciação musical.
Mas tirar no violão as canções de "As Quatro Estações" é tarefa possível para quem ainda arranha o violão.
De novo, o violão.


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