|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
Odair José, agora cult, grava inéditas
Produzido por Zeca Baleiro, novo álbum faz parte de tentativa do cantor de receber reconhecimento artístico
Rotulada de "cafona" no passado, obra do compositor é valorizada agora por artistas da nova música brasileira
MARCUS PRETO
DE SÃO PAULO
Não é de hoje que o valor
da obra de Odair José, 61,
vem sendo reavaliado.
Quando, em 2006, o compositor foi homenageado
com o tributo "Eu Vou Tirar
Você Desse Lugar", em que
artistas pop como Pato Fu,
Paulo Miklos, Mundo Livre
S/A e Mombojó regravaram
suas canções, algumas pedras foram arrancadas do
muro que o separa dos compositores "sérios" da MPB.
Agora, o cantor prepara álbum de canções inéditas que
pode contribuir com esse
movimento agregador.
Previsto para chegar às lojas no primeiro trimestre de
2011, "Praça Tiradentes" está
sendo produzido por Zeca
Baleiro e vai contar com repertório composto especialmente para Odair por artistas
como Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Chico César.
Baleiro conta que a lista de
candidatos a emplacar uma
música na voz de Odair era
grande, mas a ideia é que o
próprio compositor colocasse suas canções na roda.
"Ele achava que não gravaria mais discos, já tinha feito tudo", diz o produtor. "Isso por causa da demanda.
Em shows, as pessoas querem ouvir aquelas mesmas
músicas -tanto os velhos fãs
quanto a nova geração que
passou a acompanhá-lo."
"ADÚLTERO"
A nova geração a que Baleiro se refere vem dedicando
atenção especial ao trabalho
de Odair, sobretudo à safra
dos 1970 -sucessos como
"Vou Tirar Você Desse Lugar" e "Uma Lágrima".
Artistas mais jovens, como
Marcelo Jeneci, Tatá Aeroplano (da banda Cérebro Eletrônico) e China, não desviam de colocar Odair entre
as referências.
Mas é no trabalho da banda cearense Cidadão Instigado, liderada por Fernando
Catatau, que ecos do velho
Odair ressoam com resultado
mais surpreendente.
"O que me interessa em
Odair é a maneira simples e
direta com que ele atinge as
pessoas", diz Catatau. "É
exatamente a mesma verdade que sinto quando ouço
Raul Seixas, Black Sabbath."
O cantor Otto, outro dos
admiradores de Odair, traça
um paralelo entre o compositor goiano e outro, nascido
em Cachoeiro de Itapemirim,
com igual vocação popular.
"Odair e Roberto Carlos fizeram basicamente o mesmo
caminho, mas em estradas
paralelas", diz. "Roberto é
para a família, para meu pai e
minha mãe. Odair é para o
cabaré, é para meu pai sozinho, para o homem adúltero.
Ele é o verdadeiro rebelde."
DOCUMENTÁRIO
Odair detecta que o preconceito da elite brasileira
em relação a seu trabalho começou a arrefecer em 2002,
graças à publicação do livro
"Eu Não Sou Cachorro, Não",
de Paulo César de Araújo.
Ali, o autor defendia o caráter combativo dos artistas
ditos "cafonas", Odair entre
eles, durante a ditadura militar, nos anos 1970.
"A memória da MPB só investigou a repressão política
e se esqueceu da repressão
moral", diz Araújo. "O autoritarismo não se expressa apenas pelo governo militar. O
quartinho da empregada e o
elevador de serviço são contribuições brasileiras à arquitetura universal. E era isso
que Odair denunciava."
Os direitos autorais de "Eu
Não Sou Cachorro, Não" foram comprados pela cineasta Helena Tassara, que toca o
projeto de um documentário.
Na tela, a luta dos "cafonas"
contra os militares (e o preconceito da própria esquerda) mudou de nome para, veja só, "Vou Tirar Você Desse
Lugar". Odair é o destaque.
Hoje, Odair só pensa no
disco novo. Esse sim, ele afirma, vai ser o último da longa
carreira, que já dura 40 anos.
"Há dez anos, eu mesmo
não defendia a qualidade do
que fazia. Falaram tanto que
meu trabalho era menor que
eu acabei acreditando", diz.
"Agora, estou vendo meu trabalho de forma mais respeitosa. Sei que minhas músicas
vão durar muitos anos e sustentar meu filhos. Mesmo depois que eu morrer."
Texto Anterior: FOLHA.com Próximo Texto: Opinião: Artista foi trilha sonora das dores de amor dos que têm mais de 40 Índice | Comunicar Erros
|