São Paulo, terça-feira, 22 de janeiro de 2008

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Arte ambígua é aposta de nova sede de museu de arte contemporânea

Exposição "Unmonumental", do New Museum, renega o conceito de obra

MARCO GIANNOTTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM NOVA YORK

O New Museum of Contemporary Art, projetado pelos arquitetos Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa, foi inaugurado no final do ano passado, celebrando os 30 anos desta instituição inovadora em Nova York. A nova sede está em Little Italy, entre a Houston e a Canal Street, sul de Manhattan, e traz agora a segunda exposição da série "Unmonumental" -"Collage: The Unmonumental Picture".
O local já é em si uma colagem pela variedade cultural: restaurantes italianos e chineses, vendinhas, lojas de cozinha industrial e uma infinidade de passantes de níveis sociais e procedências diversas. Em "Unmonumental", o fio condutor é a colagem em vários meios, como fotografia, pintura, escultura, instalação, música e novas mídias.
A colagem, técnica que surge a partir do cubismo sintético, quando Picasso e Braque em 1911 passam a utilizar materiais como jornal, papel de parede etc., permite novos arranjos espaciais a partir da fragmentação. Desse novo raciocínio construtivo surgem movimentos derivados, como o construtivismo e a arte concreta.
O projeto do prédio do New Museum se inspira neste princípio. O edifício parece um conjunto sobreposto de cubos, uma construção instável de peças de Lego, que é contundente, bela, dinâmica, inovadora. Os interiores celebram o cubo branco, mas a volumetria moderna guarda surpresas, onde o espaço se recorta em saídas e rampas inesperadas. O elevador já é uma obra de arte. Dentro da caixa enorme de metal verde, tem-se a impressão de estar em uma peça do artista minimalista Donald Judd, mas em movimento contínuo.
O mesmo não pode ser dito do que está exposto ali. Encabeçado por Richard Flood, o projeto curatorial parece ir na contramão da arquitetura, e a arte não contraria o título "Unmonumental". A colagem, pela utilização de materiais até então alheios à arte, como jornal, terra e vidro, alimentou a fusão entre a alta cultura e o popular.
Aqui, o aspecto das obras nos leva ao ponto de não sabermos o que faz uma obra ser arte. Por outro lado, se a incorporação do kitsch nas primeiras colagens modernas revela irreverência e humor, o kitsch parece ser o objetivo final das obras.
O aspecto crítico da obra se esvai, sua precariedade passa a ser fundamentada por um discurso multicultural que não é nem antropologia, nem sociologia, mas uma espécie de palavreado conceitual que só alguns curadores de última geração são capazes de articular.
O aspecto negativo da obra de arte já aparece com os "ready-mades" de Duchamp, mas, como o próprio artista afirmava, a novidade do "readymade" está em colocar o próprio aspecto da obra em questão. Hoje em dia, apenas pelo fato de as obras estarem no museu e em belos projetos arquitetônicos como este, tornam-se peças de arte. A negação da dimensão estética é notável, ao ponto de não sabermos se o plástico jogado no chão é arte.
Certa vez, Hannah Arendt disse que a essência da cultura frente à barbárie está na preservação dos objetos artísticos. Se os arquitetos do New Museum souberam fazer deste espaço uma experiência contemporânea, o mesmo não pode ser dito das obras ali presentes. Salvaguardadas pelo discurso conceitual e pela presença magnífica do próprio museu, as obras são como crianças mimadas, renegam o próprio espaço onde estão.


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