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ANÁLISE
Autor fotografava em palavras imagens mentais
ALEXANDRE MATIAS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O grande trunfo de Hunter S.
Thompson foi ter vivido como
Hunter S. Thompson e ter escrito
sobre isso. Autobiógrafo por opção, abraçou a egolatria que o jornalismo finge desprezar para narrar o mundo à sua volta, onde estivesse. Escrever e viver eram tarefas indissolúveis -era preciso, a
todo custo, fotografar em palavras as imagens mentais que a superposição de diálogos, números,
personagens, alucinações e teorias paranóicas formava atrás de
seus olhos, em livros tão ultrajantes quanto improváveis como
"Hell's Angels", "A Grande Caçada dos Tubarões", "Generation of
Swine", "The Proud Highway" e
"Songs of the Doomed".
Para isso, criou um pacote completo. Pegou a base do chamado
"new journalism" norte-americano, em que nomes como Tom
Wolfe e Gay Talese aspiravam casar literatura e jornalismo, e ousou criar sua própria vertente, batizada estupidamente de "gonzo",
justamente para não ser levado a
sério. Com o termo "gonzo" vinham todos os elementos da mitologia de Thompson -drogas,
beisebol, humor ácido, bebidas,
autodestruição, armas, política, a
careca, a geração rock'n'roll, a viseira acompanhada do óculos
Rayban e da camisa florida... Um
coquetel explosivo que contava
com ingredientes díspares e tipicamente americanos, como Hemingway, Fitzgerald e Kerouac.
"É um estilo de "reportagem" baseada na idéia de William Faulkner de que a melhor ficção é muito mais verdadeira que qualquer
tipo de jornalismo -e os melhores jornalistas sempre souberam
disso", escreveu na contracapa da
primeira edição de seu clássico
"Medo e Delírio em Las Vegas".
"Isso não significa que a ficção seja necessariamente "mais verdadeira" que o jornalismo -ou vice-versa- mas que tanto "ficção"
quanto "jornalismo" são categorias artificiais".
Tudo mera desculpa para que
Thompson, um escritor quase cinematográfico e um bon vivant
extremista, fizesse o que desse na
telha. Afinal, transformava em
"jornalismo gonzo" qualquer situação que visse.
"A verdadeira reportagem gonzo requer os talentos de um mestre do jornalismo, o olho de um
artista/fotógrafo e os colhões firmes de um ator", continuava.
"Desse jeito, imaginei que o olho e
a mente do jornalista funcionariam como uma câmera. O texto
seria seletivo e necessariamente
interpretativo, mas, uma vez que
a imagem fosse registrada, as palavras seriam definitivas".
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