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Cinema
Para Salles, "Tropa" segue "Cidade"
Cineasta, que foi o primeiro brasileiro a levar Berlim, comenta vitória do filme de José Padilha, que sai em DVD no dia 27
Diretor de "Central do Brasil" avalia que produção recente vive tendência de tratar de "temas urgentes" a partir de pontos de vista internos
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
Primeiro brasileiro a ganhar
o Urso de Ouro do Festival de
Berlim, por "Central do Brasil",
há dez anos, o carioca Walter
Salles, 51, acha que o mesmo
prêmio entregue a "Tropa de
Elite" no último fim de semana
reforça uma tendência iniciada
com "Cidade de Deus" (2002).
O filme de Fernando Meirel-
les teria lançado uma espécie
de modelo caracterizado pelo
tratamento de "temas urgentes
a partir de livros que viram realidades específicas desde dentro". Leia, a seguir, entrevista
que o cineasta concedeu à Folha, comentando o prêmio de
"Tropa", que sai em DVD no
próximo dia 27.
FOLHA - O que achou da premiação
de "Tropa de Elite" em Berlim?
WALTER SALLES - Um feito e tanto. José Padilha e seus colaboradores mais próximos, como
Wagner Moura, o roteirista
Bráulio Mantovani, o produtor
Marcos Prado e o montador
Daniel Rezende estão de parabéns. O argumento de que a seleção deste ano era fraca não é
pertinente: Paul Thomas Anderson, Mike Leigh e o diretor
coreano Hong Sang-soo são cineastas que dão relevância e legitimidade a qualquer festival.
FOLHA - O filme foi acusado de
"fascista". Você achou surpreendente que um festival presidido por
um cineasta de esquerda, como Costa-Gavras, premiasse "Tropa"?
SALLES - Uma das características mais interessantes do filme
é justamente a de embaralhar
esses conceitos.
Um exemplo: dois críticos
tão respeitados quanto Cássio
Starling Carlos, da Folha, e
Thomas Sotinel, do "Le Monde", leram o mesmo filme de
forma inteiramente diferente.
FOLHA - José Padilha disse que a vitória de "Tropa" reforça a evolução
técnica do cinema brasileiro desde a
tão falada "retomada", dos anos 90.
Concorda com isso?
SALLES - O filme de José Padilha reforça uma tendência iniciada por Fernando Meirelles
em "Cidade de Deus", que é a de
tratar de temas urgentes a partir de livros que viram realidades específicas desde dentro.
No caso de "Cidade de Deus",
o ótimo livro de Paulo Lins. No
de "Tropa", o de Rodrigo Pimentel, Luiz Eduardo Soares e
André Baptista. A questão técnica está sujeita a uma gramática cinematográfica que parece
dialogar com "Cidade de Deus":
cortes rápidos, voz em "off",
mistura de atores profissionais
e não profissionais.
FOLHA - Você concorda com a idéia
de que, ao lado de "Central do Brasil" e "Cidade de Deus", "Tropa" forma um conjunto que define a temática do novo cinema brasileiro?
SALLES - Não, isso seria reduzir
em excesso suas possibilidades
e características. Onde ficariam
um filme tão brilhante quanto
"Cão sem Dono", do Beto
Brant, ou tão agudo e delicado
quanto "Mutum", de Sandra
Kogut? São produções que,
mesmo sem atingir um grande
público, irrigam e oxigenam toda uma cinematografia.
Onde ficariam, também, os
documentários? Um universo
que o próprio Padilha ajudou a
enriquecer com "Ônibus 174" e
que passa por uma fase fértil?
Da mesma forma, o cinema
chinês não é só Zhang Yimou
ou Chen Kaige. É também
Wang Bing e Jia Zhang-ke, e é
salutar que seja assim.
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