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61º Festival de Cannes
Festival recebe Nachtergaele com aplauso comedido
Na estréia ontem, parte do público aplaudiu monólogo de Paulo José; outros deixaram sessão em cena de incesto
"A Festa da Menina Morta" mostra comemoração dos 20 anos do sumiço de uma garota; família vive em torno de seu fantasma
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A CANNES
Ao apresentar seu primeiro
filme como diretor, ontem, na
mostra Um Certo Olhar, do 61º
Festival de Cannes, falando em
francês, Matheus Nachtergaele
disse que "A Festa da Menina
Morta" pertence a "uma grande
parte do cinema brasileiro, porém não muito conhecida, que
se arrisca a falar desse país
enorme, maravilhoso e terrível
que é o nosso".
A produtora Vania Catani
(Bananeira Filmes), uma das 15
pessoas da equipe que acompanhava Nachtergaele no palco
da sala Debussy, fez uma breve
e emocionada declaração: "Há
cinco anos, entrei pela primeira
vez nesta sala. Desde então, sonhei sozinha que esse seria um
bom lugar para começar a mostrar nosso filme".
A pedido do diretor, toda a
equipe se deu as mãos e ficou
em silêncio durante um minuto, repetindo o gesto que antecedeu cada dia das filmagens.
No fim da projeção, que teve
a presença do júri da mostra, os
aplausos foram comedidos; alguns críticos franceses trocaram impressões favoráveis ao
filme.
Comparado a Glauber Rocha
por uma jornalista do festival,
Nachtergaele disse: "Admiro
muito o Glauber. Ele é um mestre para todos os que, de fato,
amam o cinema. Mas será que
fui tão louco para fazer um filme como os dele?".
Santidade
Em "A Festa da Menina Morta", a família de uma criança desaparecida no interior do Amazonas passa a viver em torno de
seu fantasma. O filme acompanha a preparação da festa dos
20 anos do desaparecimento da
menina. Nesse tempo, os moradores da região passam a atribuir poder milagroso aos trapos do vestido que a garota usava e a acreditar na santidade de
quem os encontrou -um irmão
dela, vivido por Daniel Oliveira.
O comportamento religioso
da comunidade e a dinâmica interna da família são observados
pelo filme. Na casa de Santinho,
é tacitamente proibido falar da
mãe, que se matou.
O pai dedica-se à bebida e às
mulheres, mas é também
amante do próprio filho, que
julga santo. O irmão descrê do
milagre e do caráter religioso
da festa -"Qual o milagre aqui?
Isso é só um bando de homem
bebendo cerveja"-, mas se
sente compelido a participar.
A exploração econômica e
política da fé religiosa é outro
aspecto do filme, insinuado na
festa, ápice do filme e da interpretação de Oliveira.
Incesto
Enquanto o público consome
churrasco e música regional do
lado de fora, dentro da casa de
Santinho há um reencontro
com sua mãe (Cássia Kiss) e as
razões do ato desesperado.
Durante a sessão do filme, alguns espectadores abandonaram a sala, a partir do momento
em que se concretiza a primeira
cena de incesto, filmada na discrição de uma penumbra. Outros aplaudiram um monólogo
do ator Paulo José, que interpreta um padre.
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