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Crítica/"Poeira: Demônios e Maldições"
Nelson de Oliveira cria paródia sem graça
ESPECIAL PARA A FOLHA
"Poeira: Demônios e
Maldições", de Nelson de Oliveira, é
uma novela que mistura ficção
alegórica e realismo fantástico
-híbrido que, nos anos 1960,
teve no autor José J. Veiga um
hábil praticante.
A história pode ser resumida
assim: em São Paulo, como em
outras grandes cidades, a enorme produção de livros leva ao
caos urbano.
Parques e praças somem para dar lugar a bibliotecas; grupos descontentes fazem manifestações; o governo lança medidas provisórias contra a impressão de novos títulos; edições novas e reedições clandestinas aparecem cada vez com
maior frequência e quantidade
de volumes; o Exército, aproveitando a confusão, tenta dar
um golpe de Estado.
Nesse cenário, conduzido em
chave cômico-apocalíptica,
convivem um bibliotecário
enlouquecido com a situação
dos livros; sua mulher, a sensual Estela; e um visitante, chefe do setor de estoques, cuja
função é achar lugares para
construir novos depósitos.
Posteriormente, ficamos sabendo que está em curso uma
verdadeira "revolução dos livros", conduzida por um demônio subterrâneo, que vive num
inferno de nove círculos de
produção livresca.
Conquanto a alegoria da primeira parte possa ser lida como
amplificação cômica pertinente da situação de superprodução de livros desimportantes, a
parte subterrânea da narrativa
perde a graça e o tom.
A paródia se reduz a espaços
exóticos e a uma narrativa quase juvenil de ficção científica.
A suposta grande sacada é intercambiar a ideia do mal (e,
forçosamente, de Mallar-
mé) com a de Hal, o computador de "2001 - Uma Odisseia no
Espaço" (1968). Em vez das máquinas, é o velho livro que agora
se interpreta como "superconsciência tentacular" a pretender
dominar o universo.
O livro seria francamente ilegível, não fosse o tratamento
estilístico engenhoso: acumulação de adjetivos caóticos, descrições aleatórias, frases cortadas, diálogos sem marcas formais, decomposições geométricas das cenas, desnaturalização de hábitos prosaicos, intercalação de capítulos fora da sequência principal de ações etc.
Graças a isso, alguns dos 77
capítulos curtos são bem resolvidos como exercício de experimentação narrativa. Destaco
especialmente a divertida sequência dos capítulos 34 a 48,
que acompanha o ponto de vista do visitante trapalhão, excitado por Estela. Se se sustentassem sozinhos, resultariam
numa novela muito melhor.
Infelizmente, os capítulos
posteriores ao 65, em que as explicações dadas nunca acertam
o tom difícil da piada solene, fazem com que "Poeira: Demônios e Maldições" seja apenas
mais uma evidência do excedente livresco.
(ALCIR PÉCORA)
POEIRA: DEMÔNIOS E
MALDIÇÕES
Autor: Nelson de Oliveira
Editora: Língua Geral
Quanto: R$ 45 (400 págs.)
Avaliação: regular
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