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CINEMA
Novo filme de Julio Bressane traz Alessandra Negrini no papel da rainha egípcia e Miguel Falabella no de Júlio César
Longa brasileiro tropicaliza Cleópatra
FERNANDA MENA
DA SUCURSAL DO RIO
No lugar do rio Nilo, o mar de
Copacabana. Em vez da aridez da
paisagem do deserto egípcio, a
exuberância da mata atlântica. No
papel de Júlio César, Miguel Falabella; no de Cleópatra, Alessandra
Negrini; e no de Marco Antônio,
Bruno Garcia.
A primeira versão cinematográfica em língua portuguesa do
maior mito feminino da Antigüidade foi tropicalizada. "Cleópatra", novo longa-metragem de Julio Bressane, foi inteiramente rodado no Rio, e teve suas filmagens
concluídas anteontem, em estúdio -após percorrer locações como o Parque Lage, o Forte de Copacabana e o Palácio Tiradentes.
A produção -orçada em R$ 4,2
milhões- por si só já é inusitada.
Mas a Cleópatra de Bressane ainda guarda outras surpresas. Após
se debruçar sobre "Vidas Ilustres", de Plutarco, e de montar
uma biblioteca literária e iconográfica sobre Cleópatra, Bressane
optou por uma versão lírica, e não
épica, do mito. As instituições públicas, a luta pelo poder e as grandes batalhas desenroladas poucas
décadas antes do nascimento de
Cristo servem de pano de fundo
para a vida íntima da rainha.
Esqueça a Cleópatra de franjinha reta, dos cenários suntuosos,
do trono de ouro e dos banhos
com leite de cabra. A imagem de
bela irresistível e sedutora surge
entrelaçada à de mulher intelectual e diplomática. "Cleópatra
não nasceu Cleópatra. Ela se fez
Cleópatra. E o cinema ainda não
tratou disso", diz o diretor.
"Cleópatra foi uma intelectual.
Uma moça criada dentro de uma
biblioteca, com uma educação severíssima. Aprendeu 12 línguas,
estudou matemática, astronomia,
todas as ciências divinatórias e o
que havia de química e de física.
Foi preciso um grande esforço e
uma tremenda desilusão consigo
própria para que ela se abandonasse aos estudos", diz.
Bressane acrescentou a isso descobertas do final dos anos 90 sobre a atuação diplomática da rainha. "Ela tinha uma tolerância
com os judeus, a quem prometeu
proteção, concedeu liberdade de
crença, autorizou a construção de
sinagogas no delta do Nilo."
Para ele, esses são aspectos curiosos ao se recompor o mito para
uma mulher que reuniu Ocidente
(Grécia) e Oriente (Alexandria)
além "do sensualismo moralista
que os primeiros romanos e os
cristãos amaldiçoaram".
Mas a sedução e a educação dos
sentidos pelos quais a bela rainha
se tornou célebre também estão
no filme. Representadas, entre
outras, por uma cena de sexo
-guardada a sete chaves- em
que Cleópatra e Júlio César se deitam numa espécie de cama-concha em Copacabana.
"Essa é uma Cleópatra onírica,
íntima, poética. É um filme sobre
o feminino. E sobre a grandiosidade de um mito do Egito, de
uma mulher que é várias mulheres. E a modernidade do filme está
justamente nessa personagem
multifacetada", diz Negrini, dentro de um longo vestido lilás, com
cabelos cacheados e uma coroa da
qual pendem serpentes douradas.
Para Bruno Garcia, apesar de
toda a ludicidade de evocar um
tempo por meio de cenários e vestes, "é preciso muito mais do que
uma roupa de romano para se
tornar um romano".
Como se reconstrói uma época
perdida? Fellini certa vez disse
que, no limite, isso é impossível e
que fazer um filme histórico é
criar uma ficção científica sobre o
passado. E Bressane prepara a sua
ficção, para "inserir o mito de
Cleópatra na memória e no imaginário da língua portuguesa".
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