São Paulo, terça-feira, 22 de julho de 2008

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Newton Moreno faz sucesso com "Nordeste sincero"

Dramaturgo e diretor pernambucano recebeu 2 prêmios e 1 indicação ao Shell entre 2005 e 2008; cinema está nos planos

No Rio, "As Centenárias" já foi vista por quase 20 mil pessoas; "Memória da Cana" é novo projeto com seu grupo, Os Fofos Encenam


LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL

Já está virando barbada: nos últimos quatro anos, o nome do ator, dramaturgo e diretor pernambucano Newton Moreno, 39, só não apareceu na lista de indicados ou vencedores do prêmio Shell (o mais importante do teatro brasileiro) em 2007 (premiação relativa aos espetáculos de 2006).
Em 2005, os jurados paulistanos do troféu o apontaram melhor autor por "Agreste", retrato do amor puro de um casal sertanejo. No ano seguinte, a direção de "Assombrações do Recife Velho", baseada na obra de Gilberto Freyre e montada com seu grupo (Os Fofos Encenam), lhe valeu uma indicação ao prêmio. Quatro meses atrás, o júri carioca do Shell reconheceu a dramaturgia de "As Centenárias", sobre o cotidiano de duas amigas carpideiras.
Modesto, Moreno divide os louros com as equipes das peças. "Tive sorte de encontrar atores e diretores interessantes e interessados no que eu estava propondo. Não tem segredo. Cultivo uma escuta coletiva, sou meio arisco à idéia de uma dramaturgia pronta, em que não se pode mexer."
A julgar pela quantidade de projetos que ele desenvolve para os próximos meses, não custa aconselhar: guardem espaço em suas cédulas de votação, jurados do Shell.
Para outubro, está prevista a estréia de "Olhos de Amália", adaptação de um conto de sua autoria sobre "uma mulher que ama demais, e isso toma proporções que ela precisa resolver, pois é uma missão muito grande que os céus mandaram: amar a humanidade inteira".
No primeiro semestre de 2009, deve vir "A Memória da Cana" (título provisório), novo trabalho d'Os Fofos, que Moreno descreve como "filho de "Assombrações'": será uma costura de ficção com memórias pessoais do elenco -formado por cinco atores de ascendência nordestina e uma paulista, que fará a "estrangeira".

Geoespetáculo
Há também "Da Possibilidade da Alegria no Mundo", reunião de peças curtas de Alemanha, Brasil, Irã, Portugal e Uruguai. A idéia do dramaturgo, já encampada pelo Sesc, é partir dos textos para "compor um geoespetáculo".
A lista inclui ainda incursões pelo cinema. Em parceria com o documentarista Evaldo Mocarzel (de "À Margem da Imagem"), ele pretende filmar uma apresentação de "Assombrações" nas ruas de uma cidade do interior pernambucano e casar ao registro "causos" fantasmagóricos da população.
Curtas-metragens baseados em suas peças de temática homoerótica "A Cicatriz É a Flor" e "Deus Sabia de Tudo e Não Fez Nada" completam as ambições em película.
Essa investigação do amor entre iguais foi gradativamente perdendo terreno, em sua dramaturgia, para a busca das raízes. "De início, queria entender a possibilidade de aprender com as diferenças. Hoje, me interessa discutir o lugar do mistério, do sagrado, da memória em cena. Eu fico um pouco com essa pergunta: qual a necessidade de espiritualização do homem contemporâneo?", diz.

Sertão com Rosa
Radicado em São Paulo há 18 anos -em meados dos anos 90, morou em Campinas, onde cursou artes cênicas-, ele acertou as contas com a Recife natal via Guimarães Rosa:
"Estava preparando o espetáculo de formatura da faculdade, "Primeiras Estórias". Voltei para o meu Estado para poder lidar com esse material, e aí caiu a ficha. Tinha feito um movimento de me afastar temporariamente de uma herança de cultura popular, de uma força de produção que tem a ver com a linguagem do Nordeste para vir a São Paulo e conhecer outras estéticas. Logo vi que isso era um discurso meu, era a minha verdade, a coisa mais sincera que poderia oferecer".
Daí três de seus textos mais recentes ("Agreste", "Assombrações..." e "As Centenárias") se passarem no Nordeste -sem receio de rótulos "regionalistas". "Acho que estou perdendo o medo disso: estou cada vez mais querendo voltar para Limoeiro (PE) e ouvir minha mãe, recuperar o meu sotaque, tentar entender onde a experiência humana é grande, seja no Crato (CE) ou em Berlim."


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