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A obra dos mortos-vivos
Romance de Jane Austen recebe série de adaptações bizarras após livro
que junta ‘Orgulho e Preconceito’ com zumbis; obra sai no Brasil em 2010
RAQUEL COZER
DA REPORTAGEM LOCAL
É uma verdade universalmente reconhecida que um autor na posse de uma boa ideia
necessita estar preparado para
sofrer imitações. Se o achado
cair em domínio público, a sorte é que ele não estará mais vivo
para saber o fim da história.
No caso da inglesa Jane Austen (1775-1817), a história parece mesmo não ter fim. A autora
do clássico "Orgulho e Preconceito" -cuja frase inicial inspirou o início deste texto- teve
todos os romances adaptados
para filmes e outros livros. E é
improvável que pensasse que,
dois séculos depois, suas crias
passariam a viver entre zumbis,
vampiros e monstros do mar.
Até o fim do ano, ao menos
cinco livros que unem Austen a
esses seres sairão nos EUA. O
fenômeno bizarro começou em
abril, com "Pride and Prejudice
and Zombies" (orgulho e preconceito e zumbis), e surpreendeu até o pai da ideia, o editor
Jason Rekulak, da Quirk Books.
"Achava que os fãs de Austen
odiariam os zumbis e que os de
horror odiariam o romantismo.
Não fazia ideia", ele diz à Folha,
por telefone, de Nova York, referindo-se aos 850 mil livros
vendidos no país, o que o mantém há 18 semanas entre os dez
mais do "New York Times".
Na capa, aparecem os nomes
de Jane Austen e Seth Grahame-Smith, escritor convidado
por Rekulak -80% do texto é o
original, de 1813, e o restante
foi criado por Grahame-Smith.
Traduções já foram iniciadas
em 18 idiomas, incluindo alemão, francês e japonês. No Brasil, a obra sairá pela Intrínseca,
em 2010. O êxito garantiu ainda uma espécie de sequência,
"Sense and Sensibility and Sea
Monsters" (razão e sensibilidade e monstros do mar).
O coautor agora será Ben H.
Winters. Mudou porque, após
"Zombies", Grahame-Smith
recebeu uma proposta de outra
editora para escrever sobre
Abraham Lincoln e vampiros.
"Ofereceram tipo US$ 500 mil.
Não podemos pagar isso", diz o
editor da Quirk. E os seres viraram monstros do mar porque
Rekulak queria algo original.
"Sabíamos que outras editoras
pegariam carona na ideia, porque é o que as editoras fazem. E
só se fala em vampiros..."
De fato, os vampiros foram
os primeiros a seguir os zumbis
na invasão à obra de Austen.
Há pouco, a Sourcebooks lançou "Mr. Darcy, Vampyre"
-Darcy é o protagonista de
"Orgulho e Preconceito". Em
dezembro, sai "Vampire Dar-cy's Desire", pela Ulysses Press.
Para a mesma data, a Ballantine anuncia "Jane Bites Back"
(Jane morde de volta), por Michael Thomas Ford. É o primeiro de uma trilogia que faz
de Austen uma vampira, há séculos sem receber pelo que escreveu e com um texto inédito
rejeitado 116 vezes -e vendo
todos faturarem em cima dela.
Parece uma ironia à tendência de enfiar mortos-vivos nas
tramas da inglesa, mas não é.
"No ano passado, percebi que
só se vendiam livros sobre Austen ou sobre vampiros e resolvi
unir os dois. Não sabia que viraria algo popular", diz Ford à
Folha. Ele afirma que "umas 12
editoras" tiveram interesse.
Ford diz admirar a obra de
Austen. Rekulak a escolheu
porque estava em domínio público -como qualquer outra
lançada antes de 1923 nos
EUA-, mas diz que passou a
gostar mais dela após editar o
livro. "Há a ideia errada de que
é algo só romântico. Não é, ela
critica a sociedade", diz Ford.
É o que defende a autora de
"Jane Austen: Adaptação e Ironia", Genilda Azeredo, professora da Universidade Federal
da Paraíba. Para ela, a obra de
Austen inclui uma sutileza que
nem todas as adaptações mantêm. "Elas destituem as narrativas de complexidade, com
tom melodramático."
Azeredo imagina que a autora e "Orgulho e Preconceito"
são tão adaptados por serem sinônimo de lucro -cita "O Diário de Bridget Jones". Ao ler
uma parte de "Zombies", diz
que não chega a ser nem paródia. "É pastiche, fica apenas na
superficialidade", avalia.
Vídeos
"Pride and Prejudice and
Zombies" ganhou trailers não
oficiais no YouTube. Para "Sense and Sensibility and Sea
Monsters", a editora pôs no ar
um vídeo em que o sr. Willoughby, ao se declarar a Marianne Dashwood, ouve um ruído no lago e pergunta: "Escutou
algo?". "Só a batida do meu coração", ela responde, minutos
antes de ele ser sugado para a
água por tentáculos.
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