São Paulo, quinta-feira, 22 de setembro de 2005

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COMIDA

Com 180 expositores, 11º Boa Mesa contrapõe cozinhas regionais

Do rústico ao contemporâneo

CRISTIANE LEONEL
DA REPORTAGEM LOCAL

A autoria de um chef se faz, antes de tudo, por sua história pessoal. É com ela que sua cozinha ganha um tempero próprio. Algo tão óbvio quanto essencial para fazer a cozinha brasileira de um Alex Atala ser um tanto diferente, por exemplo, daquela que Mara Salles realiza. Esse traço da arte gastronômica, mais do que sabido, é o conceito que rege a programação da 11ª edição do Boa Mesa, que acontece entre os dias 28 de setembro e 1º de outubro, das 13h às 22h, no ITM Expo.
Seguindo esse conceito, a curadora das aulas e workshops do evento, Betty Kövesi, concebeu uma grade em que uma mesma cozinha regional ganha diversos tratamentos, de acordo com a leitura de cada chef. Enquanto Francesco Carli, do restaurante carioca Cipriani, apresenta (no dia 1º, às 17h) pratos de uma cozinha italiana mais contemporânea, como o camarão marinado com vinho do Porto e gengibre, Hamilton Mellão, chef do Sao, segue uma linha mais tradicional, "rústica", como seu curso é intitulado (e realizado no dia 1º, às 15h15), ensinando sobre clássicos como o Macheroni com le Sarde, prato siciliano à base de sardinha fresca.
"Tenho muitos alunos aqui que querem imitar a cozinha de um grande chef", conta Betty, que é dona da escola de gastronomia Wilma Kövesi. "Mas é preciso conhecer, antes de tudo, a trajetória do chef, que, no caso da Mara [Salles], é uma pesquisadora. Ela fica um mês, por exemplo, numa fazenda em Goiás só para aprender uma buchada de bode."
Joel Ruiz, ex-chef do restaurante Toro, confirma outra afirmação da curadora, a de que só é possível ser contemporâneo após passar pelo clássico. Ele começou seus estudos pelas tradicionais regras francesas, em Lyon, para então migrar para outras cozinhas. E inovar, como mostra o programa de sua aula que acontecerá no último dia do Boa Mesa (às 18h45). "A gastronomia é como o balé, começa-se pelo clássico", confirma Ruiz. A cozinha que faz contraponto à de Ruiz no evento é a de Clô Dimet, que, aliás, assinará um cardápio espanhol mais clássico. A aula de Clô fecha a programação no dia 1º, às 20h30.
"A Espanha faz parte da minha história porque minha família é toda espanhola", conta Dimet, que, uruguaia, também trabalhou na Espanha por cinco anos, o que reforça a tese de que é a experiência que faz a diferença na criação culinária.
A curadora abre algumas exceções nesta proposta que prima pela contraposição. É o caso da cozinha peruana, representada apenas pela banqueteira Marisa Guiulfo. Não muito conhecida no Brasil, ela é considerada por Kövesi o destaque desta edição, uma vez que pouco se sabe por aqui da cozinha andina. E a recíproca é verdadeira, já que Guiulfo afirma que "la feijoada brasileña" é o que ela entende como grande delícia gastronômica nacional.

Projetos especiais
À parte as aulas, o Boa Mesa planeja espaço específico para o que acompanha o ritual que é a gastronomia, como vinhos, cachaças e charutos. Neste ano, há, por exemplo, um projeto especial batizado de Boa Taça, um grande estande fechado, criado para degustações de vinhos, onde terão acesso os visitantes que pagarem R$ 40, além dos R$ 20 que dá direito à visitação do evento. Outro estande especial é o Espaço da Cachaça, que será tematizado, com canas e alambique, e onde a bebida também poderá ser provada. No Lounge do Charuto, destaca-se uma degustação de fumo em narguilé no dia 30, sábado, às 19h. O acesso ao Espaço da Cachaça e o Lounge do Charuto é livre.
Os "estandes especiais" fazem parte da proposta de aprimorar a organização do evento, uma vez que o Boa Mesa passou a sofrer algumas críticas de visitantes e até de alguns expositores nos últimos anos. Paula Moraes, sócia da escola de gastronomia Atelier Gourmand, acredita que o evento se "descaracterizou muito" nos últimos tempos.
"Neste ano, pela primeira vez, decidimos não participar do evento, porque na última edição foi decepcionante. A feira, que era de gastronomia, virou um evento de culinária [...] Eu espero, sinceramente, que o Boa Mesa recupere seu glamour."

Trajetória
Criado em 1995, o Boa Mesa foi um evento pioneiro em São Paulo, que tinha como objetivo trazer novidades do mercado mundial da gastronomia num momento em que o setor ainda estava ganhando força no país. Houve uma expansão considerável do evento, a começar pelo número de expositores, que não passava dos 33 na primeira edição e, neste ano, já são 180. As empresas participantes são as mais diversas, desde grandes indústrias como a Sadia até as de menor porte como a Nonna Pasqua Alimentos, produtora de molhos para massas.
A cronista Nina Horta, que presenciou a estréia do evento, afirma que não acompanha o Boa Mesa desde a "época do Josimar" (Josimar Melo, jornalista e crítico da Folha, foi o idealizador do evento e vendeu os direitos do Boa Mesa para a J. Eventos, empresa do Pátria Banco de Negócios, em 2000). "Eu tenho muita preguiça de ir num lugar muito cheio. Fico muito perdida. Mas eu não acho ruim que o evento seja assim: o que os organizadores do evento podem querer senão público?" Para quem não se incomoda com multidão, vale uma visita ao Boa Mesa, que na última edição do evento registrou mais de 38 mil visitantes, e, nesta edição, os organizadores esperam alcançar os 40 mil.


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