LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

Um poeta dramático que sabota o drama. As quatro peças de Anton Tchékhov em parte encenadas em "Tchékhov4 - Uma Experiência Cênica" não têm tramas atraentes. Sua força é revelar personagens desamparados, em ações esvaziadas de sentido. Qualquer semelhança com a vida não é coincidência.
Terá sido essa característica, talvez, que inspirou o encenador russo Adolf Shapiro a montar, numa oficina de apenas um mês, um exercício de interpretação para celebrar o sesquicentenário do autor russo (1860-1904).
O ponto de partida foi seu encontro com os atores da Cia. Mundana, recém egressos da odisseia de levar à cena o romance "O idiota", de Fiódor Dostoiévski. O porto de chegada é incerto, já que, trabalho em processo, o espetáculo resultante carece de mais amadurecimento.
Alguns dos atores ainda não conseguiram abandonar os personagens com quem conviveram na peça anterior. A despeito da nacionalidade russa em comum, as criaturas de Tchékhov, saídas de "A Gaivota", "Tio Vânia", "Jardim das Cerejeiras" e "Três Irmãs", são mais apáticas que passionais, ou melancólicas que mercuriais.
Mas nem tudo é engano nesse mosaico. Algumas das atrizes, senhoras do método de Stanislavski -o encenador russo responsável, no início do século 20, pelas primeiras montagens daqueles textos- alcançam desempenho raro: revelar o patético desses seres com vocação para a infelicidade, incapazes de amar e de serem amados.
Mesmo inacabada, é uma experiência nova na escuta de um dramaturgo imortal.