São Paulo, segunda-feira, 22 de outubro de 2007

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"Deixar a música foi fácil", diz cantora

Compositora afirma que foi pintora primeiro e que os atuais executivos de gravadoras gostam apenas de "golfe e pornô'

Retorno começou a ser ensaiado há dois anos, quando ela foi convidada para compilar as músicas que a influenciaram

DA ASSOCIATED PRESS, EM NOVA YORK

Joni Mitchell voltou ao foco da atenção pública há um mês, quando o selo Hear Music, da Starbucks, tocou "Shine" em 6.500 cafés. Na mesma noite, ela esteve na première em Manhattan do filme "The Fiddle and the Drum", um balé antiguerra baseado em canções que Joni criou com o coreógrafo Jean Grand-Maitre, do Alberta Ballet.
Em seguida, correu para o vernissage de uma exposição de seus trípticos, intitulada "Green Flag Song". Focando os temas "guerra, tortura, revolução", eles foram criados a partir de imagens fantasmagóricas de negativos em preto-e-branco fotografadas de imagens do History Channel e da CNN, vindas de sua velha TV.
No dia seguinte, esfuziante, reuniu-se com o pianista de jazz Herbie Hancock, que compartilha sua crença no budismo e na fusão de gêneros musicais, para uma discussão livre durante um almoço com vários escritores. Hancock acabara de lançar "River: The Joni Letters", interpretando as canções de Joni por meio de seu prisma jazzístico com a ajuda de Norah Jones, Corinne Bailey Rae, Tina Turner e a própria Joni Mitchell. O CD saiu recentemente no Brasil, pela Universal.
A artista diz que não foi difícil deixar a música de lado durante boa parte dos últimos dez anos. Ela tinha sua pintura, que podia fazer sem se preocupar com os executivos de gravadoras. "Hoje em dia, eles [executivos] querem clones. Eles não gostam de música. Gostam de golfe e pornô."

Dias de vovó
Seu álbum anterior com material novo, "Taming the Tiger", é de 1998. Depois dele, parou de compor canções e tocar piano e violão. Cumpriu o resto do contrato com a Warner com os álbuns orquestrais "Both Sides Now" (2000) e "Travelogue" (2002), nos quais cantou standards de jazz e algumas de suas canções antigas, como "Woodstock" e "A Case of You". Então, afastou-se.
"Meus dias se resumiam a ser vovó e a assistir a muita TV. Pensava: "Será que isso vai ser o resto de minha vida?".
Joni começou a repensar sua decisão de desistir de fazer música em 2005, quando a Starbucks Entertainment a chamou para compilar um álbum com as gravações que mais a haviam influenciado. Passou seis meses revendo "tudo o que já me emocionara muito". Desde a música erudita (Debussy) até o jazz (Miles Davis e Billie Holiday), passando pelo rock (Chuck Berry) e o folk (Bob Dylan).
"Fui pintora primeiro, mas me deixei atocaiar pela música -primeiramente como hobby, para pagar pelo que eu fumava quando cursava a escola de arte", diz, ligeiramente rouca, enquanto fuma um cigarro após outro, hábito que desenvolveu aos nove anos, depois de quase morrer de paralisia infantil.
"No início, eu apenas cantava canções folk, mas então ocorreu uma tragédia em minha vida. Tive uma filha e a entreguei para adoção, e isso cava numa mulher um buraco muito grande e que é difícil explicar. Eu não tinha nenhum tostão, mas três anos mais tarde, tinha uma carreira e dinheiro", lembra Mitchell, cujo primeiro álbum saiu em 1968. "Mas não gostava da fama. Compreendi o preço dela quando ainda era jovem."
Seu maior sucesso comercial aconteceu no início dos anos 1970, em álbuns como "Blue" e "Court and Spark", mas achou o som folk-pop demasiado restritivo para suas letras.
Então se voltou a harmonias não-ortodoxas, jazz, world music e comentários sociais mais contundentes, começando com "The Hissing of Summer Lawns", em 1975.
"Fiz cinco álbuns, quatro dos quais elogiados, e depois, pelo resto de minha carreira, as reações foram sempre desfavoráveis", conta a artista. "A idéia é que você dura uma década: a artista dos anos 1960, a artista dos anos 1970... Depois disso, a indústria tenta eliminar você."
Desta vez, pelo menos, a indústria não conseguiu.


Tradução de CLARA ALLAIN

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