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ARTES PLÁSTICAS
Amilcar de Castro expõe metais em equilíbrio
TIAGO MESQUITA
CRÍTICO DA FOLHA
Na produção de Amilcar de
Castro, sempre foi constante
uma certa resistência dos materiais empregados na configuração
de uma forma desejada. Como
postura poética e política, não parece possível a esse artista trabalhar sem o respeito ao caráter das
coisas. Seus limites devem ser respeitados e incorporados.
As chapas de aço, que vêm a se
tornar esculturas, não se acomodam a formas quaisquer. Elas devem consentir, produzindo movimentos inusitados junto com o
escultor, levando em conta aspereza, opacidade e integridade. A
matéria não pode ter suas propriedades físicas corrompidas.
Torcida, ela não aceita se submeter a uma idéia atemporal. Se esforça para instituir o que se configurar, encontrando dificuldades.
Quando nos deparamos com
uma dessas peças, temos a impressão de que o metal trabalha
diante de nós, constituindo a
obra. Na sua exposição individual
na Pinacoteca do Estado, esse esforço é bem marcado. Amilcar
preserva as qualidades do material e procura um modo de ajeitá-lo tornando-o arte.
Em alguns trabalhos dos anos
70 e 80, chapas planas de ferro
eram retiradas de seu repouso,
cortadas e abertas criando corpos
vazados. O escultor buscava uma
certa tridimensionalidade, que
ampliasse a desenvoltura dessa
matéria resistente. Na dobra da
escultura, ele evidenciava a lentidão desse movimento. A resistência e o esforço para que a peça se
arqueasse realizando gesto único.
Trabalhando hoje com chapas
mais espessas, o artista dá outro
sentido à dobra. O ferro, cortado
num formato irregular, não se
abre sugerindo um corpo tridimensional. Em geral, aparece cindido em duas faces de um mesmo
corpo. Cada uma possui ângulos e
formatos distintos, como uma página dobrada. Quando ele é colocado em pé, revela o desequilíbrio
de uma face sobre a outra. Desproporcionais, elas parecem tombar cada uma para um lado. Como irmãos siameses que discordam do rumo a ser tomado.
Na peça mais impressionante,
uma placa muito alta sobe verticalmente até um limite em que
parece se direcionar ao solo. A outra face, apesar do esforço de ascensão, parece incapacitada de
conter a queda, vergando-se no
sentido oposto. No entanto, uma
dobra robusta garante a sustentação da peça. Aqui ela garante o
equilíbrio de uma peça ambígua.
O artista quase posiciona esses
trabalhos em direção ao espectador. Não é o desequilíbrio que parece interessá-lo, mas um modo
de equilíbrio, que faz o aço desengonçado parar com graciosidade.
Infelizmente, muitas vezes, algumas opções de montagem parecem retirar uma parcela desta
energia. As peças grandes em que
Amilcar corta blocos grossos, retangulares de ferro, deslocando
uma de suas partes de modo a
conseguir um novo equilíbrio, estão quase todas montadas de maneira que restitui o bloco anterior.
As possibilidades lúdicas no interior do bloco são atenuadas. De
outra maneira, o uso de bases pintadas de azul para as pequenas esculturas parece retirar algo do peso do ferro e do vigor do gesto.
São contaminadas pela cor e afastadas, em demasia, do chão, com
quem parecem guardar afinidade
eletiva. Tais percalços não impedem que se tenha o melhor em arte exposto pelas bandas de cá.
Amilcar de Castro
Onde: Pinacoteca do Estado (pça. da
Luz, 2, Bom Retiro, São Paulo, tel. 0/xx/
11/229-9844)
Quando: de ter. a dom., das 10h às
17h30; até 2/12
Quanto: entrada franca
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