São Paulo, quarta-feira, 22 de dezembro de 2004

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MEMÓRIA

Com trajetória privilegiada, a atriz integrou a trupe do Teatro de Arena e atuou em filmes de Ana Carolina

Myriam Muniz "morrem" e "permanecem"

Divulgação
A atriz Myriam Muniz, que morreu no último sábado, em cena da peça "Fala Baixo Senão Eu Grito"


SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

Quando morre uma grande atriz como Myriam Muniz, há uma sensação de perda ainda mais aguda: mais do que uma pessoa, morre o seu potencial de ser muitas, de se desdobrar em cena e na tela; morrem todos aqueles que ela poderia ainda vir a ser. Que se repita sempre a fórmula de Carlos Drummond para Cacilda Becker: na madrugada de sábado, morreram Myriam Muniz.
Por outro lado, a qualidade de seu trabalho permanece no tempo. Resgatada no livro de Maria Thereza Vargas, "Giramundo: Myriam Muniz, o Percurso de uma Atriz", sua trajetória foi privilegiada. Formou-se na Escola de Arte Dramática na época mítica, quando seus professores eram os diretores do Teatro Brasileiro de Comédia. Dividiu a aventura do Teatro de Arena com Guarnieri e Boal, entre outros, em épocas difíceis: durante as apresentações da Feira Paulista de Opinião, enfrentou a ameaça de balas, grávida.
De volta ao Arena em 20 de outubro deste ano, no ciclo "Cia. Livre Conta Arena 50 Anos", para uma fala emocionada, confirmou seu arquétipo de grande mãe do Arena ao beijar o chão do teatro ao fim do depoimento -gesto resgatado em CD-ROM, a ser lançado em maio. Professora por décadas, formou uma legião de discípulos imitadores pelo Brasil inteiro -chegou a chamar da platéia, nesse dia, seu aluno Roney Fachini para imitá-la ao vivo.
No cinema, fez uma parceria importante com a cineasta Ana Carolina, tendo participado de "Mar de Rosas" (1977), "Das Tripas Coração" (1982) e, mais recentemente, de "Amélia" (2000). No primeiro filme, aliás, contribuiu para a preparação dos atores, em uma inquietação típica de quem, aos 73 anos, se preparava para ministrar workshops para atores de todo o Brasil.
Nos últimos dias, a atriz esteve mais presente do que nunca, com o revival do Arena e o sucesso de "Nina", recente filme de Heitor Dhalia, no qual se superou como Eulália, uma aterrorizante proprietária que leva a sua inquilina a matá-la. Quando se viu na tela, chegou a ter medo de si mesma, segundo depoimento à Tribuna da Imprensa: "Não sabia que seria capaz de fazer uma personagem tão terrível. Depois de assistir ao filme fiquei com síndrome de pânico. Tive medo de morrer. Felizmente, melhorei".
Não houve mesmo razão para Myriam Muniz ter medo da morte. Na tela do cinema e na memória de quem a viu em cena estão vivas Myriam Muniz.


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