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Pânico no cinema
No politicamente incorreto "Borat", estrelado por repórter fictício do Cazaquistão, Sacha Baron Cohen provoca riso, desconcerto e polêmica
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
De tempos em tempos, o
mundo do entretenimento anglo-saxão vê surgir um nome
que leva o gênero a novos limites e ajuda a mantê-lo vivo. Para ficar em poucos exemplos,
foi assim com Peter Sellers nos
anos 50, Lenny Bruce na década seguinte e Richard Prior,
Andy Kaufman, John Belushi,
Jerry Seinfeld/Larry David e
David Chappelle, desde então.
Agora é a vez de Sacha Baron
Cohen, que o grande público
brasileiro (se ainda não o viu no
YouTube) vai conhecer em
"Borat - O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América".
Quando a Fox, o estúdio que
o produziu, estava com o longa
na mão e, insegura, não sabia o
que fazer dele, reuniu um time
"A" de comediantes para uma
sessão especial em Los Angeles,
no ano passado.
Estavam de Garry Shandling,
um dos atores mais cinicamente engraçados dos EUA, a Judd
Apatow, diretor de "O Virgem
de 40 Anos", de Larry David,
co-criador de "Seinfeld" e estrela de "Curb Your Enthusiasm", a George Meyer, roteirista de "Seinfeld". Ao final,
Meyer disse a Apatow: "Sinto-me como se alguém tivesse me
colocado para ouvir pela primeira vez "Sgt. Pepper's"."
Pode ser heresia comparar o
longa do comediante britânico
de 35 anos ao melhor álbum da
maior banda que já existiu, mas
a metáfora serve para resumir o
impacto de quem assiste pela
primeira vez Sacha Baron Cohen como o desastrado "repórter cazaque" por ele criado para
a TV. A essa altura, é quase irrelevante narrar o que o personagem faz no filme. São situações
politicamente incorretas e escatológicas de corar o pessoal
do programa "Pânico na TV".
Melhor, talvez, seja listar os
que se sentiram ofendidos.
Vão de dois romenos, coadjuvantes no que seria a aldeia natal de Borat no Cazaquistão e
que dizem terem sido retratados como "estupradores, defensores do aborto, prostitutas,
ladrões, racistas, invejosos e rudes", a dois estudantes, que
aparecem alcoolizados e afirmam terem sido submetidos a
"papel ridículo, humilhação,
perda de reputação, angústia,
mal-estar físico e psicológico".
Artigos de intelectuais, contra e a favor, foram escritos para as páginas de opinião do próprio "New York Times", mas
também das revistas "Time" e
"Newsweek" -e até do diário
econômico "The Wall Street
Journal". Quanto mais levavam
o filme a sério, mais involuntariamente engraçados pareciam. Alguns lembravam o quadro "Piada em Debate", do falecido programa "TV Pirata".
Uma sulista norte-americana, que recebe Borat para um
jantar no filme, engrossa a lista
dos ofendidos, formada ainda
por parte importante da comunidade judaica americana, que
considerou o filme anti-semita,
apesar de feito por um judeu, à
Rússia, que proibiu o longa
"por ser potencialmente ofensivo a grupos étnicos e religiosos". E o Cazaquistão, é claro.
A princípio, o governo daquele país reclamou do filme.
Chegou a comprar páginas de
anúncios veiculadas no jornal
"The New York Times" que
evocavam as belezas naturais
do Cazaquistão, terra com
"enorme população de lobos".
Depois, relaxou e gozou: por
conta do filme, o turismo ali aumentou.
Dinheiro. Eis outra baliza a
medir o impacto do filme. Com
um orçamento de US$ 30 milhões, "Borat" já rendeu US$
250 milhões no mundo inteiro.
O lucro absurdo e o desempenho inesperado nas bilheterias
ajudaram a News Corporation,
dona entre outras empresas do
estúdio Fox, a contrabalançar
seus resultados no último trimestre, de resto medíocres.
Isso levou o mogul Rupert
Murdoch a se pronunciar sobre
o filme, anunciando que viria aí
o "Borat 2". Horas depois, foi
desmentido pelo próprio Sacha
Baron Cohen, que agora trabalha num longa baseado em outro personagem que criou para
o programa que tinha na BBC-HBO, "Da Ali G Show".
É Brüno, com trema no "u",
um "jornalista austríaco" metido a modelo. Aguarde.
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