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Paixão por ídolos dá origem a livros
Autor prepara há sete anos biografia de Fernando Pessoa; há obras sobre Euclydes da Cunha e Rimbaud
MARCOS STRECKER
DA REPORTAGEM LOCAL
Andando em Lisboa há poucos anos, o advogado pernambucano José Paulo Cavalcanti
jura que viu o poeta Fernando
Pessoa (1888-1935) de costas,
nas imediações da mítica Livraria Bertrand. E ele fala sério.
Mas ele não pretende incluir
esse incidente na sua minuciosa biografia do poeta português, que lançará nos próximos
meses pela editora Record.
A publicação encerra um trabalho gigantesco desse advogado, de 61 anos, ex-secretário-geral do Ministério da Justiça
(governo Sarney). "Conheci
Pessoa com 16 anos, foi uma
paixão arrebatadora. Trabalho
[no livro] há quase sete anos."
Só para fazer a pesquisa, esteve
mais de 20 vezes em Portugal.
Para checar todas as informações, contratou um historiador
e um jornalista no país.
"Não há nenhuma passagem
que não esteja coberta", diz.
Sua obra deve ter cerca de 500
páginas (metade do tamanho
inicial), e será repleta de notas.
Tudo foi esmiuçado: obras, revistas, os locais em que viveu e
os registros nas juntas comerciais. "As três biografias anteriores ajudaram, mas o número
de imprecisões é brutal. O primeiro diz algo, e os outros reproduzem sem conferir nada."
Cavalcanti relaciona essa forma detalhista de trabalhar às
copiosas aulas de piano que teve na infância. Descreve sua
forma de lidar com a pesquisa
como "volúpia por exatidão".
Em sua casa, em Recife, há
um quarto cheio com faxes, rascunhos e e-mails que reuniu.
"Minha mulher compreendeu.
Tenho quase tudo de Pessoa no
original, uma compulsão, quase
todas as primeiras edições."
Ele não adianta detalhes do
material que reuniu, mas garante que "achou muita coisa" e
que sua visão do poeta mudou.
O trabalho obsessivo levou
Cavalcanti a participar de leilões de objetos que pertenceram ao poeta, como a coleção
de selos que conseguiu arrematar. "Minha mulher se angustia
quando os lances sobem. Mas
quanto vale uma paixão?"
Rimbaud
Dedicação semelhante tem
um dos mais respeitados tradutores do país, Ivo Barroso, 80.
Sua relação é antiga com outro
poeta, Rimbaud (1854-1891).
Ele se dedica a traduzir o francês desde a década de 70, quando sua primeira versão de
"Uma Estadia no Inferno"
(1973) ficou pronta, a convite
de Ênio Silveira, da Civilização
Brasileira. "Fiz tanto esforço
que fiquei até doente", diz.
O livro só foi publicado em
1977. Na época, Barroso deixou
o país para se dedicar a sua carreira no Banco do Brasil, que o
levou a países como Portugal,
Reino Unido e Suécia. Nesse
período, dedicou-se a traduzir a
poesia completa de Rimbaud.
Um trabalho que intensificou
ao mudar-se para Paris, em
1989, ao se aposentar.
Na França, procurou a sociedade dos amigos de Rimbaud,
atrás de conselhos. "Disseram:
se você está traduzindo, precisa
parar [de ler], ou vai ficar doido.
Na biblioteca da sociedade, havia mais de 1.500 livros de críticas e interpretações sobre ele".
O trabalho continuou obsessivo. "Quando cheguei no "Bateau Ivre", fiquei empolgado e
fiz centenas de versões. Mais de
40 tentativas para um só verso.
Não conseguia arranjar o timbre e o significado que queria."
Com a volta ao país, em 1992,
procurou uma editora para lançar as traduções. José Mario
Pereira, da Topbooks, topou.
"Em 1994 editamos a poesia
completa, que se esgotou no
mesmo ano." Em 1998 foi editada a prosa poética. E, finalmente, as cartas do poeta saíram em dezembro passado
("Correspondência - Arthur
Rimbaud", 474 págs., R$ 59).
Terminado o trabalho, Barroso decidiu doar sua coleção
rimbaudiana ao Centro Cultural do Banco do Brasil-RJ.
"Tem a cara dele em toda lombada. Sou espantado dia e noite
por ela. A única forma de me livrar é doar..."
Euclydes
Já o professor da Universidade Federal Fluminense Paulo
Roberto Pereira, 62, reúne há
15 anos material sobre Euclydes da Cunha. Ele organizou
em 2009 as obras completas do
autor, editadas pela Nova Aguilar (em dois volumes, com
2.074 págs.). "Tenho as cinco
primeiras edições de "Os Sertões.'" Além de reler todos os
textos do escritor, Pereira precisou reavaliar todo o trabalho
crítico desde a primeira edição
da obra, na década de 60.
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