São Paulo, terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

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ANÁLISE

Página não é espelho para diversidade

RONALDO LEMOS
COLUNISTA DA FOLHA

O que faz um artista "bombar" no mundo de hoje? Revistas de música? Programas de televisão? Críticas nos jornais diários? A internet e suas redes sociais? A resposta é: não tem resposta. A máquina do hype contemporâneo depende de uma relação complexa entre mídias tradicionais e sociais.
Veja o caso dos sul-africanos do grupo Die Antwoord. Você pode nunca ter ouvido falar, mas a "blogosfera" vem colocando suas fichas no hip hop escandaloso e branco do grupo como a aposta musical da vez.
Tudo começou com um post no blog BoingBoing (um dos maiores, diga-se) em fevereiro. A partir daí milhares de posts em outros blogs e no Twitter se seguiram, até que a própria mídia tradicional foi atrás.
Ao mesmo tempo, Susan Boyle veio de um programa de televisão, que a internet amplificou. E Lady Gaga entendeu como ninguém o diálogo com as diversas mídias, acenando o tempo todo com factóides para as redes sociais, enquanto fala a língua das celebridades mainstream.
Em um contexto como esse, um site como o Hype Machine é uma peça importante. Ele ajuda a por ordem ao caos da blogosfera, criando filtros que facilitam enxergar o que vem sendo ouvido em um determinado nicho.
Perceba bem a palavra "nicho". O Hype Machine não é um espelho da diversidade musical da rede. Ele é ótimo para quem busca indie rock, pop, música eletrônica e algum hip hop. Mas quase nada além disso. É um bom exemplo do fenômeno descrito como "polarização de grupo", em que pessoas com gostos parecidos tendem a se agrupar através da internet. E quando isso acontece, seus gostos ficam ainda mais parecidos... e excludentes.
Por isso, quem usa o Hype Machine está tomando o pulso musical de um desses grupos, e apenas dele. Vai ser interessante quando surgir a tecnologia que consiga transcender todos os nichos. Que agregue o zeitgeist de toda a diversidade musical da internet. Em que pressionar o "play" traga risco, incerteza e desconforto, ao nos colocar diante do outro que não tem nada a ver nem com nossos gostos nem com nossa cultura.
Só tem um problema: esse site se arrisca a não ter público.


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