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FESTIVAL DE BERLIM
Cineasta premiado ontem com o Urso de Ouro afirma que não quer fazer filmes sob encomenda
"Não me interessa Hollywood', diz Salles
do enviado a Berlim
A consagração de "Central do
Brasil" em Berlim não muda os
planos de Walter Salles, 41. O cineasta está finalizando seu quarto
longa-metragem, "O Primeiro
Dia" (ex-"Contagem Regressiva"),
que terá uma versão para TV.
O diretor, que despontou como
documentarista -dirigiu "Socorro Nobre" sobre a relação de uma
presidiária com o artista plástico
Frans Krajcberg- fez trabalhos
para a TV, como a série "Conexão
Internacional", e publicidade.
Salles falou com exclusividade à
Folha uma hora e meia após o
anúncio da premiação. Comentou
a vitória, reverenciou o Cinema
Novo, descartou dirigir filmes de
encomenda ou trabalhar em
Hollywood. Leia abaixo uma síntese do encontro.
(AMIR LABAKI)
Folha - Você esperava?
Walter Salles - Cheguei aqui
com certo ceticismo e com muita
esperança que a Fernanda (Montenegro) fosse premiada. O filme é
na verdade um homenagem para
ela e para a Marília (Pêra). Naquele
momento inicial, antes da primeira projeção, intimamente eu torcia
pelo prêmio da Fernanda.
Folha - Quando você achou que
tinha chance de ganhar?
Salles - O Urso de Ouro, só ao
chegar hoje (ontem) aqui e sentir
que havia uma torcida generalizada nesta direção. Mas achar que o
filme talvez ganhasse alguma coisa
foi depois dos dez minutos de
aplausos no Zoo Palast (sede do
festival) e depois que as sessões
públicas, nos dois dias seguintes,
começaram a ser aplaudidas.
Folha - A vitória é um reconhecimento isolado?
Salles - De forma nenhuma.
Não é um prêmio exclusivo do
"Central". Além de premiar o filme, premia uma tradição cinematográfica brasileira. Premia a memória do Cinema Novo e de seus
filhos, que foram reconhecidos em
Berlim, mais que em qualquer outro festival. E acho que premia os
filmes brasileiros que estiveram
aqui no ano passado e criaram um
interesse pelo cinema brasileiro. É
um prêmio que abre as portas. De
todas as resenhas, a que mais me
sensibilizou foi a do Nélson Pereira dos Santos na (revista) "Moving
Pictures".
Ele diz que o Brasil deixou de fazer filmes no início dos anos 90, a
retomada aconteceu em 94, mas
que a recuperação da estética e do
conteúdo do cinema brasileiro, e a
herança do Cinema Novo, acontece agora com "Central".
Folha - Você concorda que esse é
o primeiro filme em que você deixa as emoções aflorarem?
Salles - Não há dúvida. Acho
que isso aconteceu no primeiro dia
de filmagem, talvez a continuação
do que aconteceu comigo com o
"Socorro Nobre" (curta metragem
de Walter Salles que continha a
idéia original de "Central"). A voltagem inicial foi dada pelas pessoas que sentaram naquela mesa
(da Central do Brasil) e começaram a ditar cartas que tinham tal
carga emocional que fomos envolvidos por aquele estado de coisas.
Como filmamos em ordem cronológica, fomos tomados por aquilo
e resolvemos ser fiéis a isso.
Folha - Como você define "Central do Brasil"?
Salles - É um filme sobre a descoberta do afeto, sobre a ressensibilização daquela mulher (Dora, a
"escrevedora" de cartas, vivida por
Fernanda Montenegro) e sobre
um país à procura de suas origens.
Folha - A premiação muda seus
planos?
Salles - Não muda absolutamente nada. Vou continuar agora
a pós-produção do "Contagem
Regressiva", que passou a chamar
"O Primeiro Dia". E vou continuar
a desenvolver os roteiros. Não estou interessado em mudar de país.
Não me interessa a idéia de uma
carreira cinematográfica. Me interessam os filmes. Não tenho o menor interesse de seguir a trilha de
fazer filme por encomenda ou filme para Hollywood.
Folha - Quando você leva o Urso
de Ouro para o Brasil?
Salles - Semana que vem (esta
semana). Ia para os EUA para tratar do trailer americano, mas vou
ter de refazer os traileres e cartazes
brasileiros. Em vez de ir aos EUA,
vou para França, onde estão os elementos para este trabalho, e no
meio ou no final da semana volto
para o Brasil.
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