|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Crítica/pop
Com menos sexo, disco-tributo internacionaliza Gainsbourg
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma vez, quando passeava com Jane Birkin
pela King's Road, em
Londres, Serge Gainsbourg ficou triste e disse à companheira que queria voltar para a
França. "Ninguém havia aparecido para lhe pedir um autógrafo, e então ele disse que preferia
ser um rei em seu próprio reino
do que um pequeno príncipe
em um outro lugar", contou,
tempos depois, a própria Birkin
em entrevista ao "Le Monde".
Ter sido um dos ícones pop
mais importantes da França
dos anos 60 não garantiu a Serge Gainsbourg (1928-1991) a
projeção internacional que merecia. O fato de cantar em francês -e de, além disso, exacerbar as idiossincrasias dessa língua- fez do cantor, compositor
e cineasta um fenômeno geograficamente limitado.
Agora, 15 anos após a sua
morte, o álbum "Monsieur
Gainsbourg - Revisited" presta
tributo ao bardo francês justamente com uma tentativa de
internacionalizar seu legado.
Verte canções para o inglês e
entrega algumas delas à criatividade de artistas mais novos.
Se por um lado a iniciativa
democratiza a obra de Gainsbourg, por outro definitivamente a empobrece, pois, em
inglês, seus versos soam mais
pobres, vazios e menos sexuais.
É o exemplo de "Je T'Aime
Moi Non Plus" (1969), hit condenado pelo Vaticano por simular um orgasmo feminino
-o da própria parceira do cantor, Jane Birkin. Na versão de
Cat Power & Karen Elson, a
canção surge correta e emotiva,
mas musicalmente mais contida. E o chato é que tenta esconder a pieguice da melodia em
vez de escancará-la -que era o
verdadeiro charme da original.
O vocalista do Placebo, Brian
Molko, encarna a canalhice e o
jeito sujo de cantar de Gainsbourg na cheia de ruídos "Requiem for a Jerk", enquanto os
Rakes emprestam a roupa do
novo e comportado rock inglês
a "Le Poinçonneur des Lilas".
É do cantor britânico Jarvis
Cocker a tarefa de reler a monumental "Je Suis Venu te Dire
que Je M'en Vais". O ex-vocalista do Pulp se sai bem e mostra que seu estilo de cantar sussurrando longamente é herança direta do cantor francês. Mas
falta à canção o choro feminino
com quem Gainsbourg "duelava", ao fundo.
Alguns hits ficaram de fora.
Como "Aux Armes Et Cetera",
versão reggae debochada da
"Marselhesa", hino nacional
francês. Ainda assim, a fase "jamaicana" de Gainsbourg está
muito bem representada por
"Lola Rastaquoere" na voz de
Marianne Faithfull.
É de sentir falta, ainda, de
"Lemon Incest", que, para muitos, sugeria um ato sexual entre
Serge e a própria filha de 14
anos, Charlotte, além de outros
sucessos, como "La Javanaise"
e "Bonnie and Clyde".
Se não por outros motivos, a
coletânea tem o mérito de lembrar que Gainsbourg sobrevive
e influencia para além de suas
espalhafatosas, e muitas vezes
oportunistas, polêmicas.
MONSIEUR GAINSBOURG
Gravadora: Universal
Com: Franz Ferdinand, Jane Birkin,
Placebo, Marc Almond, Françoise
Hardy, Michael Stipe e outros
Quanto: R$ 36
Texto Anterior: Keane mostra melancolia sem choramingos em 2º disco Próximo Texto: As melhores faixas Índice
|