São Paulo, domingo, 23 de julho de 2006

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Plástica digital

Globo usa programa de computador para embelezar cenas e rejuvenescer atrizes, como Regina Duarte, que tem 59 anos e interpreta personagem entre 45 e 50 na novela "Páginas da Vida"

LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Como Regina Duarte consegue, à beira dos 60 anos, ter a pele tão lisinha e sem rugas que vemos em "Páginas da Vida"?
O segredo atende pelo nome de Baselight. Não se trata de um creme caríssimo, plástica ou botox, e sim de um programa de computador comprado pela Globo numa feira de tecnologia de Las Vegas. Não é um tratamento na pele da atriz, mas em sua imagem no vídeo.
O software é bem mais do que um cirurgião plástico digital. Tem múltiplas funções para melhorar a qualidade das imagens, dentre as quais a correção de luz e cores. "Sinhá Moça", a atual novela das seis, tem "cara" de cinema graças a ele.
O rejuvenescimento é só uma das armas do software, mas não a menos importante para "Páginas da Vida", uma vez que Helena, a heroína interpretada por Regina Duarte, tem entre 45 e 50 anos, enquanto a namoradinha do Brasil completou 59 em fevereiro. Era algo que a simples maquiagem não poderia ter resolvido.
Para remoçar a atriz, o Baselight cria uma espécie de "máscara" virtual a partir de seu rosto, com imperfeições corrigidas. O operador do computador, então, escolhe pontos de "tracking" ("seguindo a pista", em tradução literal), que podem ser, por exemplo, os olhos.
É como se ele desse a ordem: "os olhos da máscara devem perseguir os da atriz". Assim, a "máscara" digital se move de acordo com os movimentos do rosto da personagem em cena.
O uso do Baselight para melhorar a aparência das heroínas pode ser comparado ao que o software Photoshop faz nas fotografias, de acordo com Marcelo Siqueira, diretor de efeitos especiais da Casablanca, a maior empresa de finalização de filmes do país. O programa é utilizado por revistas masculinas para apagar, nas fotos, celulites, estrias e outros "inconvenientes" das mulheres nuas.
"O tratamento para melhorar a imagem é realizado há muito tempo na publicidade e no cinema. Na televisão, era mais difícil, em razão da pressa nas gravações. Isso agora está mais fácil com esses novos softwares", afirma Siqueira, que trabalhou nos filmes "Se Eu Fosse Você" e "Deus É Brasileiro", entre outros.
A estréia do Baselight na Globo foi em "Sinhá Moça", focada no efeito "cara de cinema". Em "Páginas da Vida", veio o rejuvenescimento, além de outros tratamentos para "harmonizar" cores e iluminação.
O programa é empregado na pós-produção, ou seja, as cenas são gravadas e editadas normalmente e, só no fim do processo, passam pelo software. O interessante é que os elementos da cena podem ser trabalhados separadamente. Não é um filtro ao qual a cena é submetida por completo. Uma atriz pode ter a pele rejuvenescida enquanto o ator que contracena com ela permanece com seu rosto "original". Adivinhar quem passou e quem não passou pelo Baselight pode ser um jogo divertido para o espectador de "Páginas da Vida". Será que as espinhas de Thiago Lacerda sumiram de um capítulo para outro "na vida real" ou graças ao Baselight?
A Globo não dá detalhes sobre o uso do software. Quando questionado sobre seu efeito rejuvenescedor, Jayme Monjardim, diretor de "Páginas da Vida", respondeu, por e-mail: "Nossa preocupação é que as imagens sejam sempre bonitas e agradáveis ao olhar. A estética da novela é um conjunto de fatores, começa pela iluminação no estúdio ou nas externas, passa pela caracterização dos personagens, pelo enquadramento das câmeras até chegar ao uso do Baselight".
O autor, Manoel Carlos, diz que foi consultado sobre o uso do software e aprovou a idéia. "Todos os recursos à nossa disposição devem ser usados, e o Jayme os usa de maneira equilibrada. Imagens bonitas merecem o melhor tratamento para chegarem ainda mais bonitas para o público."
A Folha o questionou sobre a necessidade de tornar Regina Duarte mais moça para interpretar Helena. "Ela também está muito bem e bonita pessoalmente, conforme tenho visto quando me encontro com ela", se limitou a responder.
Ricardo Waddington, diretor de "Sinhá Moça", disse que o software "é justo com a beleza de nossas atrizes". "A imagem do vídeo era muito dura, cruel. É evidente que o tratamento favorece as atrizes, como já acontecia no cinema. O Baselight faz justiça com nossas atrizes, que já são lindas."
Ele afirma que o uso do software é resultado de três anos de pesquisa na Globo. "Não basta existir o programa, é preciso saber usá-lo. Nossa equipe foi treinada em Las Vegas pelos fabricantes do software."
Marcelo Siqueira lembra que a ferramenta terá de ser aperfeiçoada com a mudança para a TV digital. "A nitidez será maior do que a dos aparelhos atuais, e os truques de hoje seriam notados pelo público."


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