São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

País na TV agora não é só classe média, diz diretor

Fernando Meirelles vê "democratização dos temas" após "Cidade de Deus" e "Carandiru'

Com projeto de série sobre procuradores, diretor se empolga com a operação Satiagraha: "Gilmar Mendes dá um vilão sensacional"

DA REPORTAGEM LOCAL

Leia abaixo a continuação da entrevista com Fernando Meirelles. (LAURA MATTOS)

 

FOLHA - O autor de "Vidas Opostas" [Record], que se passava na favela, disse ter sido influenciado por "Cidade de Deus". A Globo fez "Duas Caras", também em torno de favela. Seu filme teve o papel de levar a favela à teledramaturgia?
MEIRELLES
- Acho que sim, mas não só. Teve "Carandiru", "Tropa de Elite". Antes, tinha essa coisa de que filme de favela não dá público, o chavão de que "pobre não gosta de ver pobre". "Cidade de Deus" fez grande bilheteria, "Carandiru" superou, "Tropa de Elite" virou esse fenômeno. As maiores bilheterias, inclusive da GloboFilmes [da Globo], são filmes que têm favela, o outro lado do Brasil. Aí caiu a ficha, né, "poin"!

FOLHA - Isso foi positivo?
MEIRELLES
- Eu acho, é a cara do Brasil. Deve ser muito chato para o cara que mora na favela, assiste à TV há 30 anos e nunca se viu retratado. É uma democratização dos temas. Parece que o mundo oficial da TV era a classe média. Agora o país é tudo, não só a classe média.

FOLHA - Por outro lado, há críticas de que a favela só é retratada como violenta, nas novelas e no filme.
MEIRELLES
- No Rio, as favelas são de fato violentas, não é um preconceito, é uma estatística. Mostrar isso mais ou menos realmente é uma opção, mas é a percepção que temos da favela. Mas é um pouco estigmatizado, você tem razão. É um estigma que entendo por que existe.

FOLHA - Você tem vontade de um dia voltar à favela com outro olhar?
MEIRELLES
- Pode ser, mas não há nenhum projeto. Na O2, ficamos seis anos em favela. Teve "Cidade de Deus", depois a série e o longa "Cidade dos Homens", e "Antônia", que não mostrava violência. Acho que já demos nossa contribuição.

FOLHA - Você começou na TV como cameraman do Ernesto Varela [repórter irreverente interpretado por Marcelo Tas nos anos 80]. Por que esse trabalho é visto com nostalgia?
MEIRELLES
- Varela tinha uma liberdade que hoje, nem que queira, não se pode ter. A gente não pedia autorização, ninguém tinha que assinar nada. Além de câmera, montava o Varela. Pegava meus discos, punha música e colocava no ar. Hoje, toda semana o "Pânico" é processado. É tudo com direito [autoral], contrato. Aparece alguém na rua tem que pedir autorização. A gente não conseguiria fazer aquelas coisas com essa invasão de advogados em nossa vida, como existe hoje.

FOLHA - Como está seu projeto de fazer uma série sobre procuradores?
MEIRELLES
- Por enquanto não rolou, apesar de a Globo gostar. É genial esse tema de procuradores, Polícia Federal, Supremo Tribunal Federal, juízes.

FOLHA - A operação Satiagraha acaba sendo uma boa novela, não?
MEIRELLES
- Total, total. O Gilmar Mendes dá um vilão sensacional. Pode publicar [risos].

FOLHA - Você elogiou o Cidade Limpa de Kassab. Ele terá seu voto?
MEIRELLES
- Essa eleição vai ser difícil. Alckmin seria a minha alternativa, mas -isso pode publicar- por causa do Campos Machado [vice do tucano], não vou votar nele. Escreva aí por favor: não sei em quem vou votar, mas [olha o gravador e fala separando sílabas] por causa do Campos Machado não vou votar no Alckmin. O Kassab é um cara que consegue fazer coisas que outros não conseguiram. A restrição de caminhões, por exemplo, e tirar algumas favelas, como a da Lapa, na ponte Anhangüera... Mas a Marta falou que a ênfase dela é no transporte, o que acho interessante. Vou analisar. O que sei [grita para o gravador] é que, por causa do Campos Machado...


Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.