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"SAL DE PRATA"
Sexo e cinema brigam com o didatismo
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Peço licença ao leitor para fazer uso da primeira pessoa e
esclarecer logo de saída que sou
amigo de Carlos Gerbase e admirador do seu cinema. (Sim, embora o crítico às vezes pareça emitir
suas sentenças do alto de uma torre de sapiência, ele está sujeito a
afeições e gostos pessoais que, se
não comprometem, ao menos balizam o seu juízo.)
Por isso o novo filme de Gerbase, "Sal de Prata", me causou uma
decepção que talvez não atinja
outros espectadores.
O início é promissor: quase em
close, falando diretamente para a
câmera, a atriz Camila Pitanga,
enquanto discorre sobre o prejuízo que uma censura 18 anos poderia causar ao filme, simula uma
excitação sexual que pode ser
proveniente de uma masturbação
ou de uma cunilíngua.
Nesse plano magnífico está concentrado o melhor do cinema de
Gerbase: a sensualidade perversa,
o humor matreiro, o jogo ambíguo com a linguagem do cinema,
em que o "fora do quadro" desempenha um papel tão importante quanto o que é mostrado.
Depois disso, porém, o diretor
parece querer enquadrar as potencialidades subversivas de seu
tema numa narrativa comportada, madura, de "bom gosto". O
sexo e a discussão da natureza do
cinema prosseguem, é verdade,
mas subordinados a uma trama
amorosa artificial, um tanto solene e pouco verossímil.
Em resumo, Cátia (Maria Fernanda Cândido) é uma executiva
casada com um cineasta (Marcos
Breda) que morre de infarto deixando como obra alguns curtas e
vários roteiros arquivados em seu
computador.
Desconfiada de que o marido tivesse mantido um caso com a
atriz Cassandra (Camila Pitanga),
Cátia resolve decifrar o mundo do
cinema e levar adiante, com a ajuda de amigos do morto, seus projetos não realizados.
Cada um dos amigos tem uma
idéia diferente de cinema, o que
gera "filmes dentro do filme" bastante díspares. O que poderia ser
uma discussão divertida sobre os
caminhos do cinema acaba se
perdendo na indecisão entre radicalizar a questão ou buscar a comunicação imediata com um público amplo por meio do didatismo e de um tratamento dramático convencional.
O resultado é uma obra híbrida
que fica aquém da verve destrambelhada do melhor Gerbase.
Sal de Prata
Direção: Carlos Gerbase
Produção: Brasil, 2005
Com: Maria Fernanda Cândido, Camila Pitanga, Bruno Garcia
Quando: a partir de hoje nos cines Bristol, Iguatemi e circuito
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