|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"MÁ EDUCAÇÃO"
O ator Gael García Bernal interpreta vários personagens em novo longa do diretor de "Fale com Ela"
Almodóvar faz ambíguo jogo de espelhos
Divulgação
|
O ator Gael García Bernal se transveste no filme "Má Educação" |
SYLVIA COLOMBO
EDITORA DO FOLHATEEN
Depois de cometer um crime,
dois personagens do novo
longa de Pedro Almodóvar, "Má
Educação", entram em um cinema para matar o tempo. Ao sair,
um deles diz: "É como se todos os
filmes falassem de nós". Em entrevista recente, o cineasta espanhol disse pensar nas salas de cinema como refúgio de assassinos
e solitários. Assim, a tela seria
uma espécie de espelho daquilo
que está nas poltronas.
Essa é a chave para entender o
intrincado "Má Educação", filme
noir cheio de segredos e falsidades, romantismo extremo e a presença constante da morte. E, como não poderia deixar de ser,
com uma femme fatale, encarnada pelo ator mexicano Gael García Bernal ("Diários de Motocicleta"), desempenhando de forma
surpreendente mais de um papel.
A história se passa em dois momentos. O primeiro, nos anos 60,
quando, num colégio religioso,
dois garotos de 11 anos se apaixonam, mas têm sua relação ameaçada por um padre, que fica obcecado por um deles, de quem abusa sexualmente.
O segundo nos leva aos anos 80,
quando, aparentemente, ambos
se reencontram e um deles (Bernal), tendo virado ator, entrega ao
outro (Fele Martinez), agora diretor de cinema, um roteiro inspirado nas recordações de sua infância comum.
O que se pinta na tela é a visão
do cineasta sobre dois momentos
da história da Espanha vividos
por ele. Os repressivos anos 60,
com um olhar um tanto crítico
sobre a educação católica, experiência pela qual efetivamente
passou. E, depois, os anos 80 da
chamada "movida madrileña",
período de efervescência cultural
motivada pela redemocratização
da Espanha após o fim da ditadura de Franco. Essa época deu origem, entre outras coisas, ao próprio cinema de Almodóvar.
E é justamente sobre um jogo de
espelhos voltado ao passado que
"Má Educação" se estrutura. Há o
passado do personagem de Gael
no roteiro que entrega ao amigo,
há a interpretação do passado pelo outro, depois a filmagem dessas
lembranças, numa narrativa
cheia de ambigüidades e espelhos.
"Má Educação" guarda um parentesco próximo com o mediano
"Carne Trêmula" (1997), não é tão
tocante como "Tudo sobre Minha
Mãe" (1999) nem tão belo e triste
como "Fale com Ela" (2002).
Mas, antes que se caia na discussão sobre se esse é um Almodóvar
menor, maior ou médio, é mais
interessante notar novamente a
genialidade que está por trás de
qualquer um de seus filmes. Aqui,
como nos trabalhos anteriores, há
a engenhosidade na construção
de um universo próprio, extremo
e transgressivo, onde coisas e pessoas só fazem sentido por existirem ali. E tudo isso ao mesmo
tempo em que dialogam de uma
forma visceral com todo o resto
da humanidade.
Não é pouco.
Má Educação
La Mala Educación
Direção: Pedro Almodóvar
Produção: Espanha, 2004
Com: Gael García Bernal, Fele Martinez
Quando: hoje, às 23h30, no Cinesesc
(outras exibições amanhã, e dias 1º e 2 de
novembro)
Texto Anterior: "O Sapo e o Príncipe": Trajetórias de Lula e FHC ganham contorno superficial Próximo Texto: 28ª Mostra: Alemanha busca identidade em mundo global Índice
|