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Crítica/DVD/"Bandadois"
Filme vai além das ideias propostas em shows de Gilberto Gil
Dirigido por Andrucha Waddington, registro tem imagens de tom sobrenatural e foge do estilo de parada de sucessos
MARCUS PRETO
DA REPORTAGEM LOCAL
O cinema é parte importante do negócio. A luz,
ainda mais. Dirigido
por Andrucha Waddington e
protagonizado por Gilberto Gil,
o filme "Bandadois" transformou, para muito além do que
podia imaginar quem as viu no
palco, todas as ideias propostas
nos shows que o originaram.
Na tela, a plataforma giratória circular onde Gil se instala
com banquinho e violão ganha
a dimensão de nave espacial. A
fotografia em alto contraste e
os "takes" em contraluz criam a
névoa, os brancos estouram e
dão às imagens o tom sobrenatural. Parece cena de "Contatos
Imediatos de Terceiro Grau".
Mas nada é efeito puro, para
conquistar admiradores nerds
de "Avatar". Esse "preto e branco colorido" que a câmera inventa parece mais interessado
em imprimir, em imagem, a
melancolia e a estranheza contidas na música que se fará ali.
É esquisito pensar em Gilberto Gil associado a essas palavras -estranheza e melancolia. Mais ainda ao lembrarmos
que está sob produção musical
de Liminha- o mesmo que o
ajudou a formatar sucessos como "Realce" e "Vamos Fugir".
Mas "Bandadois" foge justamente do espírito "hitmaker".
O repertório dá força ao lado
B de Gil. Ou aos sucessos tímidos, sem oba-oba, como "Flora", "Metáfora", "Banda Um",
"A Raça Humana". É, portanto,
um anti-"Acústico MTV".
Tanto quanto a imagem, os
novos arranjos colaboram para
eliminar a sensação de parada
de sucessos. Arrancam do sol
até a esperançosa "Andar com
Fé". Na sombra, os significados
da canção se renovam.
Todo o tom sereno de "Bandadois" repercute o momento
que Gil passa agora. Encerrado
seu tempo em política, o artista
quer retornar. Mas precisa, antes, se reconhecer. A voz mudou. Agora ela arranha. Dói um
pouco. Mas também é bonita
assim -e Gil já percebe isso.
A garganta só trabalha contra
ele quando se esquece das novas limitações e tenta puxar
cantos tribais do passado, agudos que não mais alcança e nem
precisa alcançar. Sua tribo, agora, é outra. Mais íntima.
Por isso funciona tão bem a
química entre ele e o filho, Bem
Gil, no violão. Por isso são tão
bem acolhidas as novas canções, uma composta para a mulher, Flora ("Quatro Coisas"),
outra para o casamento da filha
("Das Duas, Uma").
São desta última os versos
que resumem todo o pacote,
musical e pessoal, de Gil. "Os
percalços naturais farão parte
da canção/ Serão tropeços e recomeços cada vez, cada mês/ E
vocês se acostumarão."
Ao todo, o DVD dura 120 minutos -fora outros 70 de extras, em que Gil ensina a tocar
algumas músicas ao violão.
Longo? Talvez. Mas é o tempo
que Gil precisou para contar a
história de reconciliação com a
música, com a própria voz.
Como é cinema, não precisa
ser visto milhões de vezes. O
melhor é o que se traz para a vida real, como nos grandes filmes, depois dos letreiros finais.
BANDADOIS
Artista: Gilberto Gil
Lançamento: Geleia Geral/Warner
Quanto: R$ 30 (CD) e R$ 40 (DVD)
Avaliação: ótimo
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