São Paulo, quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

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OPINIÃO

Cinema brasileiro precisa achar o equilíbrio

Blockbusters triunfaram neste ano, mas faltou público a filmes menores

Divulgação
A atriz Ana Lúcia Torre em cena de "Reflexões de um Liquidificador", de André Klotzel

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Era para 2010 ser o ano de "Avatar" e do 3D. "Avatar" perdeu o Oscar e o 3D não encantou tanto assim.
2010 acabou sendo mesmo o ano de "Tropa de Elite 2", que, com as velhas duas dimensões, se tornou o filme brasileiro mais visto em todos os tempos, com decorrências provavelmente inéditas do ponto de vista de uma intervenção imediata do nosso cinema na sociedade.
Ou alguém duvida que foi com a credibilidade ganha nos dois filmes de José Padilha que o Bope comandou a invasão do Complexo do Alemão para atacar uma fortaleza do crime organizado?
Isso não foi tudo.
Desde os anos 1980 a situação era tremendamente desfavorável ao cinema brasileiro, com o fim das salas de rua e o progressivo aumento do preço das entradas.
A classe C, a velha classe C, de dinheiro curto e alfabetização precária, mas que sempre constituiu o nosso público mais fiel, saiu de circulação.
Com o fim da Embrafilme e a criação das leis de renúncia fiscal, nos anos 1990, ninguém ignorava qual a concorrência a enfrentar: depois de anos de completa dominação das imagens de cinema por Hollywood, essa era a dicção de cinema a que o público se acostumara.
E as novas salas, em shoppings de preferência, eram destinadas às classes B e A, que sempre resistiram ao cinema nacional.
Para esse público, as imagens criadas no país eram um aborrecimento, uma anomalia -quando não uma vergonha.
Alguns sucessos aconteciam, é verdade, mas de forma um tanto esporádica e empírica ("O Quatrilho", "Central do Brasil", "Carandiru", "Cidade de Deus", "2 Filhos de Francisco"), em meio a uma sucessão de fracassos ou a rápidas ondas de aceitação localizada de determinados filmes.
A entrada da Globo Filmes no mercado ajudou a promover a aproximação com o novo público. Aconteceu aos poucos e não sem dor. De todo modo, havia uma considerável parcela do público disposta a rever em cinema uma redução da minissérie "O Auto da Compadecida", por exemplo.
No entanto, secretamente, sabia-se que aquilo era mais televisão do que cinema. E não havia mais dúvida de que o caminho escolhido para o cinema do século 21 no Brasil era o do blockbuster.
E eles passaram a se suceder com regularidade. "Se Eu Fosse Você" (1 e 2), "A Mulher Invisível", "O Divã", "Lula, o Filho do Brasil", "Cazuza", "Olga" etc. Desses, o menos bem-sucedido, "Lula", beira o milhão de espectadores.
O ano de 2010 consolidou essa tendência, começando por "Tropa de Elite 2" e seu recorde nacional de espectadores em todos os tempos, mas sem desprezar os mais de 4 milhões de espectadores de "Nosso Lar" e os mais de 3,6 milhões de "Chico Xavier" -nossos dois best-sellers espíritas.

DISTRIBUIÇÃO
Nem de longe isso significa que nossos problemas tenham evaporado. Ao lado desses êxitos podemos colocar filmes que nem de longe encontraram seu público.
Para ficar com lançamentos recentes, "Antes que o Mundo Acabe" e "Reflexões de um Liquidificador", bem recebidos pela crítica e divulgados pela imprensa, nem sequer fizeram 30 mil espectadores. Estão longe de ser os piores trabalhos ficcionais.
Esses números indicam que nossos blockbusters estão longe de transferir seu prestígio para filmes menores, isto é: a distribuição ainda é um problema grave. As verbas publicitárias exigidas para o lançamento de um filme não são compatíveis com a bilheteria dos filmes de menor alcance.
E eles são indispensáveis à saúde da cinematografia (além dos citados, filmes como "Viajo porque Preciso, Volto porque Te Amo", "É Proibido Fumar", "Serras da Desordem", "Falsa Loura", entre outros) ainda esperam por seu Marco Aurélio Marcondes (o estrategista por trás de "Tropa 2").
Encontrar o equilíbrio entre os "grandes filmes" e os pequenos lançamentos será o desafio para os próximos anos.


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