São Paulo, terça-feira, 24 de abril de 2007

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Retrospectiva celebra fotografia de Jeff Wall

Influente artista canadense ganha grande mostra no MoMA, em Nova York, onde são exibidas 40 obras de diversos anos

Wall cria universo de contemplação, que se relaciona com a arte conceitual, o cinema e a fotografia modernista


Jeff Wall
"A Sudden Gust of Wind (After Hokusai)", obra feita em 1993 por Wall, que foi diretor de cinema


LUCRECIA ZAPPI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM NOVA YORK

Jeff Wall, 61, não produz obras em série, mas a retrospectiva no Museu de Arte Moderna, em Nova York, faz com que 40 delas, a maioria montadas em caixas de luz ("back light"), formem uma reflexão compacta sobre a fotografia contemporânea. A mostra fica em Nova York até o dia 14 de maio; depois segue para o Instituto de Arte de Chicago, de 30 de junho a 23 de setembro. A seguir, vai para o MoMA em San Francisco, de 27 de outubro a 27 de janeiro.
Mesmo que Wall, um dos artistas mais influentes de sua geração, tenha uma relação profunda e declarada com a arte conceitual, com o cinema, a fotografia modernista ou a pintura do século 19, ele não tropeça em hibridismos "multimídia".
A retrospectiva cronológica organizada por Peter Galassi, curador-chefe do departamento de fotografia do MoMA, e Neal Benezra, diretor do MoMA em San Francisco, mostra como, já na fase inicial, o artista havia encontrado um caminho para uma relação não-ortodoxa com a fotografia.
Isso é visível em "Destroyed Room" (quarto destruído, 1978), feita a partir da tela épica de Eugène Delacroix "A Morte de Sardanapalo" (1827) ou "Picture for Women" (1979), um eco de "Bar em Folies-Bergère" (1881-82), do pintor Édouard Manet.
"Passei pelos anos 60, época em que todos os pressupostos das artes plásticas foram postos em questão. Realmente não conseguia fazer nenhum tipo de arte até então", explica o fotógrafo em entrevista por telefone de Vancouver, onde nasceu e mora.
Wall, que, aos 20 anos, era pintor e, em meados dos anos 70, trabalhou como diretor de cinema, fala da dificuldade de se adaptar à fotografia tradicional, embora não veja nisso uma recusa. "O documentário pede uma aproximação diferente e só porque não escolhi esse gênero não quer dizer que fui fazer ficção. Nada é mais débil do que esse tipo de antagonismo."
"Queria achar um jeito de usar a cor e a escala da pintura, além da presença física que aprecio nos filmes. Com a cinematografia -e não estou falando de ficção ou produção de filme-, eu alcanço uma forma de praticar a fotografia, as fotos ficam "paradas" de uma maneira incomum. Você não nota que elas estão paradas", diz Wall, que cita o italiano Pier Paolo Pasolini (1922-1975) entre seus cineastas favoritos.
Em suas imagens "cinematográficas", o fotógrafo imagina e constrói as cenas, deixando que os personagens -sejam eles um assistente ou um passante ao acaso- façam o que costuma chamar de "gesto criativo". Wall, que não gosta de considerar isso como "perfomance", espera até que o personagem se renda à cena e aja naturalmente diante da câmera para então fotografá-lo. Isso gera um certo "estado contemplativo" típico de suas fotos, algo bem diferente de uma história contada.
"Não há nenhuma história para contar", enfatiza ele, "ao contrário do que muita gente acha, só porque uma de minhas fotos tem esse nome". "The Storyteller" (o contador de histórias, 1986), que mostra um grupo de indigentes à beira de uma estrada, tem o mesmo título de um ensaio do pensador alemão Walter Benjamin (1892-1940), que fala da memória de valores excluídos pelo progresso capitalista.

Beleza
Mas a foto em grande formato, em destaque em uma das maiores salas da exposição, é enigmática e sedutora sem ser sentimental ou condescendente. "Beleza é importante para você?" Wall se exalta: "Muito. É o que mais importa, mas não é necessariamente o que é agradável ou bonito. Ela pode ser perturbadora", diz.
Nesse sentido, o mundo imagético de Wall está mais propenso a ser um passeio melancólico por uma vida amarga e de neuroses. Isso o acompanha por toda sua obra fotográfica, seja em suas primeiras imagens, originárias de pinturas, durante a década de 80, nas quais ele explora a tradição das paisagens panorâmicas e sua ocupação pelo homem, seja nas fotos feitas nas ruas, como a explosiva "Milk" (leite, 1984) ou naquelas dos anos 90, quando sua produção se torna mais divergente e digitalizada.
Mas em três décadas de trabalho, as caixas de luz permanecem para explorar, como na pintura, as transparências. No caso de Wall, são um escape simbólico para a vida, mesmo que seja a do espetáculo: "A cor e o brilho da luz nos aproximam do mundo, mas é uma aproximação ilusória. Não fotografo o que é real", diz.
E onde essa dialética dos meios vai dar, entre a pintura e a fotografia, por exemplo? Wall diz que não faz idéia. E que não há regras. "A única coisa que posso afirmar é que essas artes estão conectadas entre si e não há um caminho melhor que o outro. Só uma relação permanente, que sempre vai existir, e ninguém poderá ditar regras porque a arte é feita por indivíduos. O que vale é o gesto criativo", afirma ele.
Wall diz que não tem ninguém em mente quando fotografa. "Se algo acontecer, entre a foto e o público, vai ser uma surpresa", acredita ele.
Para mais imagens da exposição, acesse www.moma.org/jeffwall.


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