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Claudia Roquette-Pinto supera o
passado em "Zona de Sombra"
NELSON ASCHER
A carioca Claudia Roquette-Pinto está lançando sua terceira coletânea
de poemas. Livro estranho, denso e difícil, se há algo que ressalta em "Zona
de Sombra" é o intenso empenho da
autora de romper com sua maneira anterior de escrever, maneira que atingira cristalização precoce e consumada
no seu segundo volume, "Saxífraga".
Como o título (remetendo a W.C.
Williams) indicava, muitos dos
textos descendiam do objetivismo
americano e, no embate entre clareza e obscuridade sugestiva,
triunfava geralmente a primeira.
Os patronos que, declaradamente nas epígrafes, Claudia invoca
para a ruptura são Paul Celan e
Georg Trakl, por um lado, e René
Char, por outro.
Há no livro um lado ainda objetivista que se condensa em momentos de que nenhum anglo-americano cultor da poesia japonesa se
envergonharia: "na lousa da noite/ os grilos vão deixando reticências". Ela continua também a se
valer de recursos que dominara
antes, como os termos raros ou
inesperados e as palavras montagem -"silêncio-cutelo", "camurça-conceito", "corpo-arremesso", "dedos-palafita".
Mas o nome "Zona de Sombra"
define perfeitamente o lugar onde
a autora sabe que está se embrenhando e não falta, em seu poema,
o reconhecimento explícito disso,
por exemplo, ao dizer: "quando
abandonamos o nítido/ por um
pouso menos claro".
É num poema -talvez o melhor
do livro- onde evoca "A Terceira
Margem do Rio" de Guimarães
Rosa, não diretamente, mas de
forma oblíqua, através da letra homônima de Caetano Veloso, que
ela registra mais eloquentemente
seu antiprograma: "signo,/às escuras,/ a mão nua abrindo o fio/
(começa comigo) a/costura invisível/do rio".
Livro: Zona de Sombra
Autora: Claudia Roquette-Pinto
Lançamento: Editora Sette Letras
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