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Para diretor, "não adianta querer entender seus filmes"
DA ENVIADA A CANNES
Conversar com o diretor
Apichatpong Weerasethakul
ajuda, e muito, na compreensão de seus filmes.
O tailandês de 39 anos modula suas frases quase como
se fossem uma prece. Se a
resposta é, no conteúdo, um
pouco mais dura, ele procura
arrematá-la com o riso tímido, bem oriental.
Weerasethakul conversou
com a Folha e com quatro
jornalistas da Ásia e da Austrália um dia antes de ganhar
a Palma de Ouro.
Paciente, tentava limitar
as divagações que seu filme
"Lung Boonmee Raluek
Chat" (tio Boonmee que se
lembra de vidas anteriores)
alimenta, deixando claro
que, apesar de ter feito um filme com seres de outro mundo, não é religioso. "Apenas
faço meditação", afirma.
Na entrevista a seguir,
concedida numa tenda montada à beira do mar da Côte
d'Azur, ele fala sobre o que
espera do cinema e tranquiliza quem não entende seus filmes. Não é para entender.
Weerasethakul desaponta, apenas, quem quer saber
como se pronuncia seu nome. O primeiro nome soa,
mais ou menos, como se lê. O
segundo, é impossível reproduzir fielmente. Todas as letras viram duas ou três sílabas anasaladas.
FOLHA - "Tio Boonmee..." é
um filme difícil, estranho. O
que você diria para os espectadores que não têm paciência para o seu cinema. Eles
deveriam tentar entendê-lo?
Apichatpong Weerasethakul - Diria: "Relaxem!". Não
adianta querer entender
muito, não. Abram suas
mentes e deixem as imagens
entrar. Mas as pessoas são diferentes e não espero que todas gostem do que faço.
Tem gente que vai achar
meus filmes chatos. Mas, às
vezes, eu também, quando
vejo filmes comerciais, não
entendo, não consigo entrar
naquela loucura.
O que é fazer cinema no seu
entendimento?
Eu só faço um filme quando ele é o único recurso para
contar uma história. Se eu
pudesse escrever essa história, eu não faria um filme.
Mas as pessoas sentem faltam, justamente, da história,
do sentido mais imediato.
Eu não li o que saiu sobre o
filme aqui, mas o que me move não é o que vão achar dele.
Em cada filme, sou movido
por uma pergunta diferente.
Neste caso, a história fazia
parte da concepção do filme.
Mas você fez roteiro?
Para conseguir recursos,
eu preciso de um roteiro.
Como consegue dinheiro para fazer filmes que, claramente, não têm um mercado?
É cada vez mais difícil conseguir. É por isso que, nesse
filme, tenho quatro ou cinco
países envolvidos. O dinheiro vem, basicamente, de fundos públicos desses países.
Mas está difícil porque agora
dizem que sou reconhecido e
não preciso mais desses fundos. Só que eu preciso.
Você vive de cinema?
Não, eu faço dívidas com o
cinema. Eu vivo de arte. Vendo obras para galerias.
Seus filmes são vistos na Tailândia?
Muito pouco. Eles saem
em dois cinemas. Qualquer
lançamento envolve promoção, conversa com os donos
de sala. Estou um pouco cansado disso, até porque só temos multiplex, com muita pipoca. Nesse ambiente, nem eu ia querer ver meu filme.
E o cinema que se faz hoje no
mundo, te agrada?
Acho que o cinema já foi
muito mais desafiador. Nos
anos 1960 e 1970, tínhamos
filmes mais interessantes.
Fomos nos tornando todos
muito parecidos e nossos filmes também. Tudo parece
tão previsível. E o cinema nos
permite ir para mundos paralelos. Por que não ir?
O seu filme coloca homens e
animais no mesmo plano. Por
que você fez isso?
Minha ideia é representar
a troca de energia entre homens, animais e plantas. O
homem pode dividir suas
memórias com a natureza.
Primeiro, o roteiro tinha uma
narração que explicava tudo.
Mas então nós mudamos isso. Temos de respeitar a imaginação do público.
Não queria ser pretensioso
ou intelectual demais, mas
queria ser abstrato.
Uso elementos da fantasia
infantil que não precisam ser
levados tão a sério. Alguns
exprimem só sensações.
Você veio para o festival com
o seu país no meio do caos [o
Exército atacou os rebeldes
de um grupo chamado "camisas vermelhas"]. Você teve algum problema?
Sim, eu só consegui sair
porque fiquei sob proteção
da Embaixada da França. É
muito triste tudo o que está
acontecendo no meu país.
E é difícil, daqui, entendermos os confrontos.
São muitas as facções,
muitas as questões envolvidas. Mas nunca imaginei que
pudéssemos chegar a tamanha violência. É triste o que
está acontecendo na Tailândia, mas é importante. As desigualdades são imensas. As
pessoas tinham que reagir.
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