|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MARINA LIMA
Cantora deve lançar disco ao vivo a partir da nova turnê, para "retribuir elegantemente" à gravadora
"Estou interessada em ocupar meu lugar, que está lá"
DO ENVIADO AO RIO
No pique da volta, Marina Lima
admite o que considera uma solução de consenso com sua gravadora, Universal: o lançamento de
um disco ao vivo fundado no
show que estréia nesta semana em
Minas Gerais.
"Eles foram cavalheiros na crise,
tenho de retribuir elegantemente.
Não estou com essa bola com eles
para negar", justifica. Na continuação da entrevista, fala sobre o
show e o possível CD ao vivo.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Folha - A Universal sabia de seus
problemas quando a contratou?
Marina - Eles não sabiam. Não
posso reclamar de nada. Eu era de
lá antes de ir para a EMI, eles têm
muito respeito por mim. Acho
que perceberam que não ia ter jeito, que algo estranho estava acontecendo e não adiantava fazer
pressão, porque não ia rolar. Eles
foram cavalheiros. Quiseram saber, mas não pressionaram.
Folha - Há disco novo em pauta?
Marina - Acho que eles vão querer gravar um disco ao vivo deste
show. Para mim não é má idéia,
porque o show está muito bom. É
dele que talvez venha o disco, se
for o caso. Não vou dizer "não,
não quero", até porque não estou
com essa bola com eles para negar. Tenho de retribuir de alguma
maneira, elegantemente.
Folha - O que aconteceu com o selo que você tinha?
Marina - Tenho muita visão de
carreira, da minha ou de pessoas
com quem me identifico musicalmente. Como eu sentia que não ia
poder continuar naquele momento, quis ajudar outras pessoas. Mas dá tanto trabalho, as
coisas não dão certo, a gravadora
cobra... O selo está lá, mas deixa
eu me sentir com fôlego para começar a cuidar das coisas como
acredito. (Enrique Diaz passa e
oferece uma pastilha. Marina
brinca: "É para a garganta? Não
preciso disso, imagina".)
Folha - Quando ensaia, o que você sente da sua voz? Ela está 100%?
Marina - Está. Minha voz voltou.
Voltei a praticar técnica vocal, para esquentar a musculatura para o
show. Está melhor a cada dia, voz
é como ginástica. Estou contente
de poder voltar a mostrar um trabalho em que acredito.
A maioria dos artistas hoje em
dia tem bandas de 13, 14 integrantes. Não gosto, minha banda somos eu e mais cinco. Aprendi a
não ter medo dos silêncios, a gostar do vazio, a só colocar elementos quando eles têm de estar ali.
Isso a música eletrônica me ensinou muito. Essa coisa do mundo moderno não é decadente, é
toda uma outra sonoridade. Gosto muito disso. Neguinho chama
de bate-estaca... Ela é feita de poucos sons, mas muito fortes. O que
interessa é a frequência dos sons,
os sons graves. Gosto dos silêncios, dos vazios. Isso minha ida ao
deserto me trouxe.
Folha - Como é voltar a um mercado que vem mudando rapidamente? Você terá de se readaptar?
Marina - Eu, não. Não tenho
obrigação de me inserir em nada.
Meu trabalho existe. Quem o
acompanha desde o início vai entender. Existe um lugar para esse
trabalho, talvez não o dos 2 milhões de cópias. Mas não é com isso, também, que estou preocupada. Estou interessada em ocupar o
meu lugar, que está lá. Minha tribo foi aumentando com o tempo.
Se eu continuar agindo de acordo
com minha bússola interna, vão lá
ver. Não estou voltando calçada
no sucesso de ontem, há poucos
sucessos antigos no show.
Folha - É que no mercado atual
uma artista como Daniela Mercury,
por exemplo, sofre por não ser popularesca o suficiente para o que a
MPB virou, nem sofisticada o suficiente para um nicho específico.
Marina - Não quero falar desse
ou daquele artista, mas quem tem
talento não tem de ficar preocupado correndo atrás. Essas crises
e dúvidas são maravilhosas para o
artista. À beira do abismo, estamos prestes a voar, como cantei
em minha música. O artista tem
de se renovar, não para seguir
uma tendência, mas para colocar
seu trabalho na altura dele.
Um verdadeiro criador tem de
confiar até nessas crises. Muito
sabiamente, parei de cantar, fui
para o deserto. E voltei fascinada
com os oásis que encontrei, louca
para contar, para falar até sobre a
crise que vivi com certo humor,
de forma positiva. Vai haver isso
no show. Vão estar lá a crise, o humor, as dúvidas, autocrítica, autodeboche. Não quero vender crise.
Folha - Você não sente que o Brasil passou da beira do abismo, que
já caiu nele de vez?
Folha - Não quero ser pessimista, mas estamos num buraco muito difícil de sair. A gente está em
depressão (ri). Precisamos de
uma comissão de médicos para
sarar essa história. Mas a música é
uma linguagem em que estamos
na altura do resto do mundo. Por
acaso, é onde trabalho.
Texto Anterior: Síssi Próximo Texto: Relâmpagos - João Gilberto Noll: Tomates Índice
|