São Paulo, domingo, 24 de agosto de 2008

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Crítica/show

Tom leva Caetano e Roberto a limite da voz

Apesar dos poucos ensaios e de alguns deslizes, cantores encararam com força repertório do maestro da bossa nova

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

N ão faltaram errinhos, uns versos esquecidos, pequenos ruídos saídos de uma caixa de som. Mas, como se diz no Rio, quem estava lá para regular mixaria? O Teatro Municipal carioca lotado -mais de 2.000 pessoas- aplaudiu várias vezes, na noite de sexta, o encontro histórico entre Roberto Carlos e Caetano Veloso em torno da obra de Tom Jobim. Na saída, "privilegiado" era uma das palavras usadas por espectadores para traduzir como tinham se sentido. Em São Paulo, a dupla se apresenta amanhã e terça, no auditório Ibirapuera, com ingressos esgotados.
Além do mais óbvio, que foram os poucos ensaios (quatro), um bom álibi para os deslizes pode ser o homenageado. Maior autor brasileiro de canções, Tom Jobim leva qualquer cantor a seu limite -a não ser que se fique nos sambas simples, o que ambos não fizeram. Ou melhor, até fizeram na abertura, às 21h36, com "Garota de Ipanema", que a execução maciça ao longo do tempo tornou fácil. Mesmo assim, nervosos, titubearam no início, e Roberto se esqueceu de um previsto "ba-da-ba-da" no meio.
No dueto seguinte, "Wave", já de pé, eles se soltaram e tiveram as eventuais dificuldades reduzidas pela opção de alternarem os versos. A cada intervalo, Roberto olhava no monitor para conferir a letra -o que repetiu em boa parte do show, mas que também faz quando o repertório é seu mesmo.
No seu set de seis músicas, Caetano só se deu uma relativa folga na segunda, "Ela É Carioca". Em "Por Toda a Minha Vida", "Inútil Paisagem", "Meditação", "Caminho de Pedra" e "O que Tinha de Ser", precisou usar toda a extensão de sua voz, não se deixar cobrir pela orquestra -tocando belos arranjos de Jaques Morelenbaum- e ainda buscar a expressão das letras. A sofrida "O Que Tinha de Ser" foi o momento de maior peso de toda a noite.

Plebeu
Depois do interlúdio com a instrumental "Surfboard", Roberto reapareceu de uma forma um tanto plebéia: andando na penumbra até o microfone, enquanto numa tela de filó eram exibidas imagens de Tom. A direção de Monique Gardenberg e Felipe Hirsch, que deu uma moldura discreta e bonita para o show, poderia ter garantido o recato do Rei nesse momento.
Ele cantou a sua versão para o espanhol de "Insensatez" e mostrou a voz irretocável em "Por Causa de Você". Embora cativando nesta e na seguinte, "Lígia", ainda soaram como músicas trazidas pelo maestro Eduardo Lages para o universo conhecido de Roberto.
Com "Corcovado" e "Samba do Avião", o cantor surpreendeu ao não evitar o DNA de samba das músicas. "Ele começou a carreira cantando samba, entende do assunto", comentou o parceiro Erasmo Carlos. Para Roberto, com sua voz límpida e ampla, cantar com mais economia é que é o desafio. Em "Eu Sei que Vou te Amar", até soltou a interpretação no bolero que a canção virou, mas soube ser contido e comovido ao declamar o "Soneto da Fidelidade", de Vinicius.
Os duetos finais resumiram o show: pequenos erros de "quem-canta-o-quê" suplantados pela alegria dos cantores e pela emoção do público. Depois de "Teresa da Praia", "A Felicidade" e "Chega de Saudade", Caetano e Roberto voltaram para dividir "Se Todos Fossem Iguais a Você" e, novamente, "Chega de Saudade". Mostraram-se grandes, mas sem brigar com o homem que aparecia enorme num painel no palco. A noite foi da melhor música brasileira, ou seja, de Tom.

Avaliação: ótimo


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