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Cinema/estréia
Mel Gibson faz sua "Paixão de Maia"
Como em "A Paixão de Cristo", "Apocalypto" chega às telas cercado de polêmicas e falado numa língua que não é o inglês
Produção, que não se deu bem nas bilheterias norte-americanas, chegou a ser considerada racista por ativistas indígenas
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Quando era adolescente, segundo contou em entrevistas,
Mel Gibson era chamado de
"Quase" por um valentão da escola que o perseguia. Era o
maior insulto de que poderia
ser alvo, disse. Remete a uma
passagem do livro "Apocalipse", do Novo Testamento, que
afirma: "Assim, porque és morno, e não és quente nem frio,
vomitar-te-ei da minha boca".
"Quase" é como um valentão
maia urbano chama Pata de Jaguar, membro de uma tribo rural, que é o herói do novo longa
do polêmico ator e diretor nova-iorquino. Seu épico maia do
século 15, "Apocalypto", estréia
hoje em São Paulo. É mais uma
tentativa de Gibson de não ser
um quase-diretor em Hollywood, cidade que devora quase-diretores no café da manhã.
Conta a história do jovem caçador e guerreiro Pata de Jaguar, que tem de passar por extremo sofrimento para alcançar a redenção. Nesse sentido,
lembra o filme anterior que
Gibson dirigiu, "A Paixão de
Cristo", e também porque é todo falado numa língua que não
o inglês -o iucateque nesse caso; aramaico e latim, naquele.
Também não chega sem polêmicas, o que valeu ao filme o
apelido de "A Paixão do Maia".
Se o "Paixão" original rendeu
ao diretor a acusação de anti-semita -só reforçada pela batatada que fez ao ser parado dirigindo embriagado na Califórnia e culpar os judeus "por todas as guerras do mundo"-,
"Apocalypto" foi criticado por
retratar uma civilização avançada como um bando de carniceiros selvagens e por cometer
erros históricos.
Polêmica
É racista, disseram ativistas
indígenas da Guatemala, por
onde se espalhava boa parte do
império maia. "Mel Gibson reproduz um conceito ofensivo e
racista de que o povo maia era
bruto e que por isso não só merecia como necessitava do "resgate" dos europeus brancos",
disse Ignacio Ochoa, da Fundação Nahual, de cultura maia.
É errado, disseram historiadores, porque mistura épocas
-acredita-se que o declínio do
império tenha começado no século 8, talvez pela destruição
ambiental causada pelo excesso de gente, e não no século 15,
por decadência moral e pela
chegada dos primeiros espanhóis. "Eu desprezo o filme",
disse Julia Guernsey, professora de história da arte da Universidade do Texas. "É como se alguém fizesse um filme sobre a
sociedade norte-americana e
colocasse Madonna e Marilyn
Monroe no mesmo carro."
Nem todos pensam assim.
"Pode-se argumentar que "Apocalypto" desumaniza os nativos
americanos, fazendo de seus
antepassados monstros, mas
acho que faz o oposto", escreveu Craig Childs, autor do livro
"House of Rain", sobre civilizações desaparecidas na América.
E completa: "Caçadores oprimidos são apresentados como
pessoas com as mesmas emoções universais de todos os humanos. E os maias urbanos são
retratados como sábios políticos e religiosos".
O filme não foi bem de bilheteria nos EUA. Os produtores
esperam que os espectadores
internacionais vejam a obra e a
julguem sozinhos.
Os paulistanos terão essa
chance a partir de hoje.
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