São Paulo, quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

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Cinema/estréia

Mel Gibson faz sua "Paixão de Maia"

Como em "A Paixão de Cristo", "Apocalypto" chega às telas cercado de polêmicas e falado numa língua que não é o inglês

Produção, que não se deu bem nas bilheterias norte-americanas, chegou a ser considerada racista por ativistas indígenas


SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

Quando era adolescente, segundo contou em entrevistas, Mel Gibson era chamado de "Quase" por um valentão da escola que o perseguia. Era o maior insulto de que poderia ser alvo, disse. Remete a uma passagem do livro "Apocalipse", do Novo Testamento, que afirma: "Assim, porque és morno, e não és quente nem frio, vomitar-te-ei da minha boca".
"Quase" é como um valentão maia urbano chama Pata de Jaguar, membro de uma tribo rural, que é o herói do novo longa do polêmico ator e diretor nova-iorquino. Seu épico maia do século 15, "Apocalypto", estréia hoje em São Paulo. É mais uma tentativa de Gibson de não ser um quase-diretor em Hollywood, cidade que devora quase-diretores no café da manhã.
Conta a história do jovem caçador e guerreiro Pata de Jaguar, que tem de passar por extremo sofrimento para alcançar a redenção. Nesse sentido, lembra o filme anterior que Gibson dirigiu, "A Paixão de Cristo", e também porque é todo falado numa língua que não o inglês -o iucateque nesse caso; aramaico e latim, naquele.
Também não chega sem polêmicas, o que valeu ao filme o apelido de "A Paixão do Maia". Se o "Paixão" original rendeu ao diretor a acusação de anti-semita -só reforçada pela batatada que fez ao ser parado dirigindo embriagado na Califórnia e culpar os judeus "por todas as guerras do mundo"-, "Apocalypto" foi criticado por retratar uma civilização avançada como um bando de carniceiros selvagens e por cometer erros históricos.

Polêmica
É racista, disseram ativistas indígenas da Guatemala, por onde se espalhava boa parte do império maia. "Mel Gibson reproduz um conceito ofensivo e racista de que o povo maia era bruto e que por isso não só merecia como necessitava do "resgate" dos europeus brancos", disse Ignacio Ochoa, da Fundação Nahual, de cultura maia.
É errado, disseram historiadores, porque mistura épocas -acredita-se que o declínio do império tenha começado no século 8, talvez pela destruição ambiental causada pelo excesso de gente, e não no século 15, por decadência moral e pela chegada dos primeiros espanhóis. "Eu desprezo o filme", disse Julia Guernsey, professora de história da arte da Universidade do Texas. "É como se alguém fizesse um filme sobre a sociedade norte-americana e colocasse Madonna e Marilyn Monroe no mesmo carro."
Nem todos pensam assim. "Pode-se argumentar que "Apocalypto" desumaniza os nativos americanos, fazendo de seus antepassados monstros, mas acho que faz o oposto", escreveu Craig Childs, autor do livro "House of Rain", sobre civilizações desaparecidas na América.
E completa: "Caçadores oprimidos são apresentados como pessoas com as mesmas emoções universais de todos os humanos. E os maias urbanos são retratados como sábios políticos e religiosos".
O filme não foi bem de bilheteria nos EUA. Os produtores esperam que os espectadores internacionais vejam a obra e a julguem sozinhos.
Os paulistanos terão essa chance a partir de hoje.


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