São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 2009

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Artista chinês filma utopia em cinco partes

Em individual, Yang Fudong exibe épico sobre angústias da vida moderna

Artista é um dos mais respeitados do cenário contemporâneo chinês e expõe pela primeira vez no Brasil, a partir de hoje

DA REPORTAGEM LOCAL

São duas as utopias de Yang Fudong, uma narrativa e outra estética. Na videoinstalação que o artista chinês mostra no Paço das Artes a partir de hoje, sete jovens personagens tentam escapar da anestesia da vida contemporânea, deixando a metrópole para viver no campo.
No plano estético, seus cinco filmes resgatam o granulado e contraste estourado do preto-e-branco, o cinema em seu sentido mais clássico, para arrolar vistas de uma vida mais crua. Em cena, são todos chineses contemporâneos, do tipo que a globalização ensinou a vestir Burberry e fez esquecer a emoção da vida real, segundo o curador da mostra, o holandês Maarten Bertheux.
É ele quem monta no Paço a obra que Fudong, um dos nomes mais relevantes da arte contemporânea chinesa, expôs pela primeira vez na Bienal de Veneza, com a diferença de que aqui, em vez de mostrar cada um dos filmes em salas separadas, exibe todos ao mesmo tempo, ligados por passarelas.
"É como estar numa ilha, tendo a amplitude da visão em cinco partes", descreve Fudong à Folha, no meio das projeções.
É possível ver ao mesmo tempo um barco içado com seus tripulantes, levado rumo ao nada, jovens nadando num tanque cheio de tubarões, um casal nu, que troca carícias na cama, um jogo de beisebol em cima de um arranha-céu em Xangai -uma colagem estilhaçada em nome da emoção à flor da pele.
"Os jovens saem da cidade e vão para o campo, para sentir na pele outro tipo de vida", descreve Fudong. "Eles querem sentir melhor tristeza, alegria." Para isso, a fuga. Da mesma forma que os anseios utópicos dos personagens só ganham corpo longe de tudo, a obra de Fudong só ganha força a partir de escolhas estéticas precisas: o figurino que embaralha décadas e o preto-e-branco que parece anular o tempo e situar a ação numa realidade suspensa. "O preto-e-branco nos traz um senso de distância do tempo", diz Fudong. "Essa utopia traduz os sentimentos, não é só passado, memória e tradição, mas uma possível chave de leitura para o futuro."
Em contraponto à utopia, as cenas urbanas, rodadas em Xangai, ensaiam previsões sombrias para o destino de um país às voltas com a destruição e a construção. "Não sou contra a metrópole, só quis mostrar como é possível viver de outro jeito", afirma Fudong.
"Quando fiz esses filmes, não pensei nessas questões grandiosas. Só respeitei meus sentimentos."
E a tradução deles se dá melhor nas imagens que escolheu. Só dois dos cinco episódios desse épico sobre a utopia têm narração ou diálogos -o resto são filmes mudos. Num exercício visual arrebatador, Fudong consegue intercalar cenas chocantes e momentos de beleza efusiva. Se o primeiro filme retrata a paisagem como cartão-postal, evocando as pinturas chinesas que fundiam céu e terra, o terceiro abusa de enquadramentos fechados da pele humana, que vira tecido, couro e véu. Na ausência de melhor descrição, fica a frase de um personagem: "Só quero seguir meu coração, mesmo que seja vulnerável". (SILAS MARTÍ)


YANG FUDONG
Quando: abertura hoje, às 15h; de ter. a sex., das 11h30 às 19h; sáb. e dom., das 12h30 às 17h30; até 29/3
Onde: Paço das Artes (av. da Universidade, 1, Cidade Universitária, tel. 0/xx/11/3814-4832)
Quanto: entrada franca



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