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Artista chinês filma utopia em cinco partes
Em individual, Yang Fudong exibe épico sobre angústias da vida moderna
Artista é um dos mais respeitados do cenário contemporâneo chinês e expõe pela primeira vez no Brasil, a partir de hoje
DA REPORTAGEM LOCAL
São duas as utopias de Yang
Fudong, uma narrativa e outra
estética. Na videoinstalação
que o artista chinês mostra no
Paço das Artes a partir de hoje,
sete jovens personagens tentam escapar da anestesia da vida contemporânea, deixando a
metrópole para
viver no campo.
No plano estético, seus cinco filmes resgatam o granulado e contraste
estourado do
preto-e-branco,
o cinema em
seu sentido
mais clássico,
para arrolar vistas de uma vida
mais crua.
Em cena, são
todos chineses
contemporâneos, do tipo
que a globalização ensinou a
vestir Burberry
e fez esquecer a
emoção da vida
real, segundo o
curador da
mostra, o holandês Maarten
Bertheux.
É ele quem
monta no Paço
a obra que Fudong, um dos nomes mais relevantes da arte
contemporânea chinesa, expôs
pela primeira vez na Bienal de
Veneza, com a diferença de que
aqui, em vez de mostrar cada
um dos filmes em salas separadas, exibe todos ao mesmo
tempo, ligados por passarelas.
"É como estar numa ilha,
tendo a amplitude da visão em
cinco partes", descreve Fudong
à Folha, no meio das projeções.
É possível ver ao mesmo tempo
um barco içado com seus tripulantes, levado rumo ao nada,
jovens nadando num tanque
cheio de tubarões, um casal nu,
que troca carícias na cama, um
jogo de beisebol em cima de
um arranha-céu em Xangai
-uma colagem estilhaçada em
nome da emoção à flor da pele.
"Os jovens saem da cidade e
vão para o campo, para sentir
na pele outro tipo de vida", descreve Fudong. "Eles querem
sentir melhor tristeza, alegria."
Para isso, a fuga. Da mesma
forma que os anseios utópicos
dos personagens só ganham
corpo longe de tudo, a obra de
Fudong só ganha força a partir
de escolhas estéticas precisas:
o figurino que embaralha décadas e o preto-e-branco que parece anular o tempo e situar a
ação numa realidade suspensa.
"O preto-e-branco nos traz
um senso de distância do tempo", diz Fudong. "Essa utopia
traduz os sentimentos, não é só
passado, memória e tradição,
mas uma possível
chave de leitura
para o futuro."
Em contraponto à utopia, as cenas urbanas, rodadas em Xangai,
ensaiam previsões sombrias para o destino de um
país às voltas com
a destruição e a
construção. "Não
sou contra a metrópole, só quis
mostrar como é
possível viver de
outro jeito", afirma Fudong.
"Quando fiz esses
filmes, não pensei
nessas questões
grandiosas. Só
respeitei meus
sentimentos."
E a tradução deles se dá melhor
nas imagens que
escolheu. Só dois
dos cinco episódios desse épico
sobre a utopia têm narração ou
diálogos -o resto são filmes
mudos. Num exercício visual
arrebatador, Fudong consegue
intercalar cenas chocantes e
momentos de beleza efusiva.
Se o primeiro filme retrata a
paisagem como cartão-postal,
evocando as pinturas chinesas
que fundiam céu e terra, o terceiro abusa de enquadramentos fechados da pele humana,
que vira tecido, couro e véu. Na
ausência de melhor descrição,
fica a frase de um personagem:
"Só quero seguir meu coração,
mesmo que seja vulnerável".
(SILAS MARTÍ)
YANG FUDONG
Quando: abertura hoje, às 15h; de
ter. a sex., das 11h30 às 19h; sáb. e
dom., das 12h30 às 17h30; até 29/3
Onde: Paço das Artes (av. da Universidade, 1, Cidade Universitária,
tel. 0/xx/11/3814-4832)
Quanto: entrada franca
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