São Paulo, segunda-feira, 25 de junho de 2007

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Líder do Clash é biografado e vira filme

Para autor de livro sobre Joe Strummer, morto em 2002, banda de "London Calling" é mais influente hoje do que no passado

No filme "Joe Strummer - The Future Is Unwritten", diretor usa depoimentos de Bono e Martin Scorsese para resgatar a vida do roqueiro

Divulgação
Joe Strummer, líder do Clash, objeto de recente biografia e filme


BRUNA BITTENCOURT
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE LONDRES

Quase cinco anos após sua morte, Joe Strummer é um dos rostos mais vistos nos metrôs de Londres. Cartazes do documentário de Julien Temple sobre o líder do Clash misturam-se com os do relançamento dos singles do grupo no Reino Unido, enquanto uma recém-lançada biografia de Strummer recupera em mais de 600 páginas a vida agitada do roqueiro, deleite para qualquer pesquisador. Filho de um diplomata, Strummer nasceu na Turquia em 1952. Por causa da carreira do pai, morou no México e no Egito. Na Inglaterra, passou por um internato e por uma escola de arte antes de se mudar para um squat (prédio ocupado) e se envolver com a cena punk. À frente do Clash, deu o idealismo que faltava ao gênero e aos Sex Pistols no fim da década de 70. Depois de expulsar o guitarrista e letrista Mick Jones do grupo em 1983 e desmembrar a banda três anos mais tarde, enfrentou um período de depressão, agravado pelo consumo de maconha e pelo suicídio do irmão. Mas o músico soube se reinventar: atou em filmes, entre eles "Mistery Train", de Jim Jarmusch, e voltou à boa forma com um álbum solo ("Earthquake Water") e outros dois com sua banda The Mescaleros. Morreu aos 50 anos por causa de um defeito congênito no coração que ele nem sabia que possuía. Strummer era uma das figuras mais carismáticas que o rock inglês já produziu. Também era repleto de contradições. Um punk filho de diplomata, que se angustiava com o dinheiro que o sucesso lhe trazia e com a responsabilidade que tinha à frente do grupo, mas que não sabia abrir mão dos holofotes. "Joe Strummer era um poeta rebelde", resume Chris Salewicz, autor de "Redemption Song: The Ballad of Joe Strummer", e amigo de longa data do músico. Assim como Salewicz, Julien Temple conviveu de perto com Strummer e com a cena punk britânica. O diretor inglês já havia se debruçado sobre outro ícone do gênero em "O Lixo e a Fúria", documentário sobre os Sex Pistols. Em "Joe Strummer: The Future Is Unwritten", exibido na última edição do Festival de Sundance, Temple usa depoimentos de Bono e Martin Scorsese, entre outros, para resgatar a vida do roqueiro. Já Salewicz, jornalista e autor de mais de 12 livros, promove um retrato mais intenso de Strummer e de suas angústias.  

FOLHA - O sr. é autor de biografias de Bob Marley, Jimi Hendrix e Paul McCartney, entre outros. O quanto e como Strummer era único? CHRIS SALEWICZ - Dessas três pessoas que você citou, Joe é muito parecido com Bob Marley, embora nem tão distante de Jimi Hendrix e no mesmo patamar que Bob Dylan, John Lennon e Woody Guthrie [um dos mais importantes nomes da música folk] como um verdadeiro homem do povo. Joe era um cara humilde, embora tivesse uma certa dose de vaidade. Mas é necessário alguém assim para guiar algo tão único, dinâmico e culturalmente crucial como o Clash. Como Bob Marley, ele viveu em um período difícil e sobre um terreno tortuoso, mas ainda assim seguro de sua arte. Joe tinha certeza do seu destino: cinco anos antes do Clash, ele disse: "Eu sei o que vai acontecer comigo: eu vou ser um rock star".

FOLHA - Strummer era repleto de contradições. Britânico e antibritânico ao mesmo tempo, um punk filho de diplomata e um compositor que ficou milionário escrevendo letras tão rebeldes. O quanto ele conseguia lidar com tudo isso? SALEWICZ - O fato é que Joe nasceu um artista e ele sabia o que deveria fazer da sua vida. Mas isso nem sempre foi fácil. Joe era um cara complexo, repleto de contradições e às vezes confuso em relação a elas. Mas concordo com Don Letts [diretor do documentário "Punk Rock Movie"] que disse que o que ele mais gostava nessas contradições do Joe é que elas o faziam muito mais humano.

FOLHA - O que mais o surpreendeu durante sua pesquisa? O que de fato mudou com relação à imagem que tinha de Strummer? SALEWICZ - Eu sabia tudo o que está no livro antes de começar a escrevê-lo e por isso nada realmente me surpreendeu. Depois de conversar com 300 pessoas, acho que este conhecimento só foi ampliado. Mas algumas coisas me surpreenderam, como Joe ter sido membro da seita Divine Light Mission no começo dos anos 70.

FOLHA - O Clash incorporou elementos da música latina, do blues e especialmente do reggae. O sr. acha que o rock inglês faz uso desse legado hoje em dia? SALEWICZ - Sem dúvida. O Clash é hoje maior do que ele já foi. Grupos como The Libertines ou The Charlatans foram muito inspirados pela banda. Por isso que Pete Doherty escolheu Mick Jones para produzir o primeiro álbum do Babyshambles. Hoje, na Inglaterra, qualquer garoto de 16 anos tem uma banda, e eles são muito influenciados pelo Clash.

FOLHA - Em várias passagens do livro o sr. estava acompanhando Strummer. O que sr. acha da relação entre biógrafo e biografado? O quanto isso ajudou? SALEWICZ - Acho que se você conhece o seu assunto isso torna seu trabalho mais difícil. Isso deixa você muito mais sensível às extravagâncias e também a todas as pessoas que são próximas a ele. Tentei tratar isso de uma forma cuidadosa, mas nem preciso dizer que não foi todo mundo que gostou do resultado.

FOLHA - O sr. assistiu ao documentário de Julien Temple? O que achou? SALEWICZ - Achei o filme estarrecedor. Assisti ao documentário três vezes e em cada uma delas parecia que estava vendo um filme diferente. Ele é bastante denso, repleto de informação. O mais interessante é que embora sua estrutura seja linear, ela parece o contrário.


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