São Paulo, sábado, 25 de junho de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

CRÍTICA TEORIA LITERÁRIA

Ensaio sobre Poe é referência obrigatória

Claudio Weber Abramo lança análise corajosa sobre os destinos do poema "O Corvo" na língua portuguesa


ABRAMO ESTÁ INVESTINDO FRONTALMENTE CONTRA A TRADIÇÃO DOMINANTE NO BRASIL


DENISE BOTTMANN
ESPECIAL PARA A FOLHA

O escritor Edgar Allan Poe (1809-1849) anda com sorte no Brasil.
Depois do indispensável "O Corvo e Suas Traduções", de Ivo Barroso, que continua inexplicavelmente esgotado após sua segunda edição em 2000, a editora Hedra nos brinda agora com "O Corvo: Gênese, Referências e Traduções do Poema de Edgar Allan Poe", de Claudio Weber Abramo.
O livro traz o poema "The Raven" no original, 12 traduções em português, desde a primeira de Machado de Assis (1839-1908) até as mais recentes, acrescidas de uma tradução em prosa do próprio Abramo e das traduções de Baudelaire (1821-1867) e Mallarmé (1842-1898).
Mais que um estudo comparado, porém, trata-se de um ensaio corajoso, em que o autor adota uma posição muito clara: a tradução que se preocupa mais com os sons e os ritmos do que com a semântica de um poema está simplesmente desconsiderando, e de maneira consciente, o que há de mais importante nele.
Para o leitor não familiarizado com os dramas que semeiam o campo da tradução, pode parecer pouca coisa. Mas, com isso, Abramo está investindo frontalmente contra a tradição dominante no Brasil, seja em vertentes beletristas ou formalistas.
E é essa perspectiva que norteará o autor em sua análise dos destinos de "O Corvo" em língua portuguesa. Aqui se destaca um apontamento fundamental que, por si só, justificaria esta edição: o estudo de Abramo mostra que Machado, em sua célebre tradução, abeberou-se em "Le Corbeau", de Baudelaire, reproduzindo algumas interpolações e mesmo erros de interpretação da tradução francesa.
Essa rota de contorno, ademais, viria a se reproduzir em traduções posteriores, sob influência machadiana.
Abramo procede também a uma análise de algumas simbologias e referências presentes no poema de Poe, remontando a suas origens no romantismo inglês.
Mas não só, e aqui se destaca outro apontamento do autor: as possíveis raízes de "The Raven" em Anacreonte e na Bíblia, mais especificamente em Jeremias.
A poeana brasileira, com suas imensas lacunas, só tem a ganhar com essa sugestão.
Para leitores de Poe, "O Corvo", na caprichada edição da Hedra, oferece uma companhia muito agradável. Além disso, com seu aparato crítico e a defesa intransigente do "compromisso semântico" do tradutor perante a obra poética, o ensaio de Claudio Weber Abramo caberia como bibliografia obrigatória (e fecundamente polêmica) em nossos cursos de literatura e tradução.

DENISE BOTTMANN é tradutora e assina o blog naogostodeplagio.blogspot.com

O CORVO: GÊNESE, REFERÊNCIAS E TRADUÇÕES DO POEMA DE EDGAR ALLAN POE

AUTOR Claudio Weber Abramo
EDITORA Hedra
QUANTO R$ 38 (198 págs.)
AVALIAÇÃO bom


Texto Anterior: "Os manuscritos voaram", diz Vila-Matas
Próximo Texto: Literatura: Feminista E. M. Broner morre aos 83
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.