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comentário
"Se Jack Bauer pode, por que não nós?"
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Separar a obra de arte do
"zeitgeist" político em que
ela foi concebida e está inserida é como dizer que a
cineasta nazista Leni Riefenstahl (1902-2003) era
uma documentarista com
queda pela película em
preto-e-branco.
"24 Horas" é, sim, o reflexo mais bem-feito,
bem-acabado e de maior
repercussão em formato
de seriado de TV das liberdades jurídicas que o governo Bush vem tomando
em relação a conceitos como habeas corpus e direito
a julgamento justo desde o
ataque de 11 de Setembro.
Seu sucesso e os dilemas
éticos que propõe podem
ser medidos tanto pelo
curso que agora é oferecido na faculdade de Washington quanto por declarações recentes que vão do
ex-presidente Bill Clinton
(que gosta de "24 Horas")
ao professor de Harvard
Alan Dershowitz (que defende que, se na vida real a
tortura é inevitável, que
pelo menos sua aplicação
seja supervisionada por
um juiz, como em Israel).
Mas é o aspecto "vida
imita arte que imita vida"
-primeiro narrado por
uma jornalista da revista
"New Yorker"- que mais
impressiona. Há alguns
meses, o militar que comanda a principal escola
de formação de oficiais dos
EUA pediu uma reunião
com o produtor-executivo
da série, Joel Surnow, um
estranho no ninho de
Hollywood, por suas convicções conservadoras.
Queria pedir que os roteiristas "maneirassem"
nas cenas de tortura entre
Jack Bauer e os suspeitos
de terrorismo, pois começavam a ouvir dos recrutas
algo como "Se ele pode,
por que não nós?". De fato,
ampliada, é a pergunta que
se impõe a milhões no
mundo ao ouvir falar de
Guantánamo, das comissões militares especiais,
dos "vôos secretos" da
CIA, do tratamento "não-convencional" a prisioneiros: se os americanos podem, por que não o resto?
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