São Paulo, quinta-feira, 25 de setembro de 2008

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Crítica/"Última Parada 174/ruim

Longa simplifica desordem do mundo e absolve personagem

Filme define protagonista como vítima e trata sua morte como uma sucessão de acasos

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

A primeira imagem de "Última Parada 174" é de uma novela da Globo intitulada "Paraíso". Mas isso só descobrirá o espectador que decidir ler os créditos do filme até o final. De algum modo, a informação retardada indica que a citação da novela não pretende ser uma ironia com a vida infernal que veremos.
É por contaminação de outro efeito que ela ganha importância e anuncia o que virá a seguir. O diálogo adocicado e a música melosa da ficção da TV extrapolam o aparelho e passam a integrar a cena de violência trágica na qual os personagens centrais são apresentados.
Essa mistura dos sons e das imagens serve para enfatizar que estamos, seja na TV ou dentro do barraco, no terreno do melodrama.
A cena marca a ruptura de um laço familiar e a entrada de Sandro no crime. Daí até o fim, o filme definirá para o personagem uma trajetória de vítima, evitando apontar evidências sobre os responsáveis por sua exclusão, definido-a, antes, como uma sucessão de acasos.
A estratégia está na essência do melodrama, gênero no qual a simplificação extrema da desordem do mundo converte o fracassado em vítima de um complô que o isenta de culpa. Trata-se de uma ficção, pode-se alegar, o que o poupa de comparação com a estratégia de José Padilha no documentário "Ônibus 174", no qual se desenha o percurso de Sandro a partir da matriz da injustiça social.
Mesmo que a equação "favela + tráfico" faça parte do filme, Bruno Barreto evita expor razões sociais, preferindo ocupar-se em converter em boas imagens o roteiro turbinado de Bráulio Mantovani, no qual as situações da vida de Sandro se sucedem como se tivessem sido regidas por um destino contra o qual não adianta lutar.
Desse modo, a culminação de sua trajetória com o seqüestro do ônibus isenta o espectador de qualquer sentimento de responsabilidade. E satisfaz uma parcela de público que intimamente apóia a solução "bandido bom é bandido morto".

Avaliação: ruim



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