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Crítica/bom
Personagens vão além dos meros clichês
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
A
primeira imagem de
"Última Parada 174" é a
de uma televisão em
"close". Na telinha, amplificada
para as dimensões do cinema,
vemos uma cena da novela "Paraíso", exibida pela TV Globo
no começo dos anos 80. Tal escolha aponta os dois vetores
fundamentais do filme de Bruno Barreto: a definitiva "mediatização" do Brasil, que teve no
episódio do seqüestro do ônibus 174 um de seus momentos
mais reveladores, e uma construção em diálogo com o melodrama, que impera no imaginário nacional graças ao sucesso
da telenovela.
Assinado por Bráulio Mantovani, o roteiro de "Última Parada" estrutura-se a partir de
contradições interessantes: ao
mesmo tempo em que busca
humanizar a figura de Sandro
do Nascimento, desconstruindo a imagem de "demônio" que
ficou cristalizada a partir do seqüestro, ele mostra, também, o
processo de desumanização e
brutalização de um indivíduo
pela miséria social. O mesmo
conflito se estabelece no interior da estrutura dramática do
filme, que nega o melodrama e
flerta com ele o tempo todo.
Essa tensão interna gera o
que há de melhor e pior em "Última Parada". Enquanto a imagem traz o grau de crueza necessário para que a miséria não
ganhe um irritante tom higiênico, a música de Marcelo Zarvos trabalha exatamente no
sentido contrário, puxando o
filme para o melodrama.
Quase todos os personagens
ganham uma rara existência cinematográfica para além dos
clichês. Sandro do Nascimento
(Michel Gomes) é visto sem indulgência, e a opção de contar
paralelamente a história de
Marisa (Cris Vianna) também
se revela fascinante.
Mas o filme perde um bocado
de seu impacto com a inclusão
de um terceiro personagem
-aquele que seria o verdadeiro
filho de Marisa. As histórias de
Sandro e de Marisa, sozinhas, já
seriam suficientemente dramáticas -e esse terceiro vetor
acaba soando forçado, atrapalhando a narrativa e quase estragando o final, que poderia
ter um impacto muito maior.
Avaliação: bom
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