ROBERTO HIRAO
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO ADJUNTO DO "AGORA"

Uma produção pouco conhecida entre nós, "A Condição Humana" ("Ningen no Joken"), realizada há 50 anos por Masaki Kobayashi, só agora chega ao mercado americano, a partir de uma matriz em 35 mm preservada por um colecionador. O filme, exemplo do vigor do cinema do Japão nos anos 60, causou impacto principalmente pela longa duração: nove horas e meia. Nos EUA, foi lançado em quatro discos de DVD. Nos cinemas, foi exibido em três partes de pouco mais de três horas cada uma. A Shochiku, uma das maiores produtoras japonesas, bancou o filme, com toques de superprodução. Entre outras coisas, "A Condição Humana" é uma prova de que o cinema japonês não se resume a Akira Kurosawa, Kenji Mizoguchi ou Yasujiro Ozu. O notável é que, apesar de longo, o diretor Kobayashi não perde o pique em nenhum momento. O filme flui com a mesma força no começo, no meio ou no final. "A Condição Humana", exibido no Brasil como "Guerra e Humanidade", é, sem dúvida, uma obra política, mas evita o panfletarismo, dando espaço a uma história de amor. O pano de fundo é a Manchúria (China) ocupada por tropas japonesas na Segunda Guerra. As atrocidades então praticadas são mostradas com crueza. A magnífica fotografia, em branco e preto e tela larga, foi concebida na estética global da realização: contraste entre ambientes fechados e opressivos e as vastas planícies da Manchúria.
Diretor foi à guerra
"A Condição Humana" foi o projeto de vida do diretor Masaki Kobayashi. Em parceria com o escritor Jumpei Gomikawa (autor do livro homônimo), convenceu o estúdio a investir no longa. Na época (1959), o cinema japonês sentia a pressão da TV e contra-atacou com produções de alto nível. Kobayashi foi convocado a servir o Exército do Japão em 1942 e enviado à Manchúria. Lá, o militante esquerdista, que era contra o militarismo, sentiu na carne os horrores da guerra. Fazer um filme com quase dez horas não foi mero capricho do diretor. Ele argumentava ser impossível transmitir em apenas duas horas tudo o que viu (e sentiu) na guerra.