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São Paulo, quarta-feira, 26 de fevereiro de 2003

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Encenador Régy dispensa a aura do diretor intelectual

DA REPORTAGEM LOCAL

Homem de feições simples, Claude Régy, 78, dispensa a aura de diretor intelectual que sua trajetória possa suscitar.
Embora pensador, com livros publicados (como "L'État d'incertitude", 2002), ele se sente mais à vontade na pele de encenador. "O teatro que faço não traz soluções nem para a sociedade nem para as teorias do teatro", filosofa.
Desde pelo menos o final dos anos 60, quando montou "A Amante Inglesa", adaptação do romance homônimo de Marguerite Duras, ele segue a via do não-espetáculo, da não-direção.
Explica: "A representação não existe em si. A maioria dos diretores se equivoca porque não há uma obra. O teatro é um terreno vasto, vazio e ao mesmo tempo pleno em ancestralidades. Seu objetivo não se limita ao palco, deve alcançar a alma do espectador. Somos todos co-autores, o dramaturgo, o ator, o diretor e finalmente o público", afirma Régy, com sua fala pausada.
Em mais de 40 anos de palco, acostumou-se ao epíteto de subversivo da linguagem.
"Em nossa época, é uma palavra muito associada à violência, mas, no teatro, a subversão convém para se descobrir, por exemplo, qual a verdadeira natureza da violência", diz.
É assim que deseja proceder em "4.48 Psychose", peça que se opõe ao simulacro da fé, da política, do sexo, do afeto, da realidade cotidiana, da vida, enfim. "Não se pode ser de acordo com o mundo em que vivemos", diz Régy. "Um mundo doente, de falsidades e manipulações."
Mundo que, segundo o encenador, a britânica Sarah Kane (1971-99), diante da "insanidade crônica dos sãos de espírito", borrou as fronteiras para transfigurá-lo em poesia dramática.
Em sua turnê brasileira, Régy assistiu ao espetáculo "Apocalipse 1,11", do grupo Teatro da Vertigem, no presídio desativado do Hipódromo, em São Paulo.
Para ele, o grupo de Antônio Araújo é antípoda. "Ele está no sul, eu no norte, mas habitamos o mesmo planeta. Em comum, não nos ocupamos do realismo psicológico, como a maioria do teatro contemporâneo o faz, procedimento contra o qual [o ator e pensador francês Antonin" Artaud reagia com força, o mesmo Artaud que Sarah Kane lamentava ter conhecido tão tarde."
Para Régy, a base do trabalho teatral é saber que a linguagem não é capaz de dizer tudo que se quer. "Cada texto tem algo de mudo, de não-dito, que é de certa forma uma voz essencial." (VS)


ENCONTRO COM CLAUDE RÉGY -
Onde: teatro Sesc Anchieta (r. Dr. Vila Nova, 245, SP, tel. 0/xx/11/3234-3000). Quando: hoje, às 16h. Quanto: entrada franca (retirar ingresso com uma hora de antecedência).



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