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Crítica/"Insolação"
Filme canta o amor frustrado na aridez de uma cidade estilizada
Em "Insolação", cineasta Daniela Thomas trabalha com Felipe Hirsch, parceiro no teatro que estreia no cinema
ALEXANDRE AGABITI
FERNANDEZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Depois de quinze anos
realizando filmes ao
lado de Walter Salles,
Daniela Thomas mudou de
parceiro. Escolheu Felipe
Hirsch -com quem vem trabalhando assiduamente no teatro-, que estreia no cinema.
"Insolação" é uma arriscada
narrativa sobre um tema tão
trivial quanto insondável: o
amor inalcançável e a melancolia que ele engendra.
Para falar dessa utopia frustrada, a dupla de diretores escolheu Brasília como cenário:
ela também é uma utopia irrealizada, tanto na política como
no urbanismo. Mas o que vemos na tela não é a Brasília de
cartão-postal com a catedral, a
esplanada dos ministérios e outros edifícios conhecidos. O filme mostra uma Brasília fragmentada, meio em ruínas, que
jamais é nomeada.
Apenas a
monumentalidade fria dos edifícios e dos grandes espaços
abertos é preservada, trabalhada pelos enquadramentos rigorosos, cujo refinamento destila
uma poesia grave. Nessa cidade
estilizada não há viva alma
além dos poucos personagens.
Os protagonistas erram pelas
ruas, praças e edifícios dessa cidade fantasma, espaço opressivo e vertiginoso ao qual eles são
totalmente alheios. A narrativa
é rarefeita, avança ao sabor de
esparsos encontros e de silêncios intermináveis, que se tornam ainda mais pesados no espaço hostil da cidade vazia.
O núcleo central de personagens é composto por figuras
muito díspares, que têm Andrei
(Paulo José), um velho escritor,
como elo.
Ele propõe uma reflexão, uma conversa com essas
pessoas, mas o resultado são
monólogos em que ele expõe
seu isolamento e nostalgia.
Muitos desses monólogos se dirigem ao espectador, e nesses
momentos Paulo brilha pelos
matizes que imprime.
Seus desamparados companheiros de jornada são quatro.
Vladimir (Antonio Medeiros) é
um garoto de 12 anos que descobre o amor ao se apaixonar
por uma mulher. Leo (Leonardo Medeiros) vive permanentemente amargurado: é amado
por uma garota de 13 anos, que
o seduz e é rejeitada, enquanto
ele se apaixona por uma jornalista.
Uma ninfomaníaca (Simone Spoladore) só encontra
insatisfação em seus efêmeros
relacionamentos. Um enigmático vigia, mudo o filme inteiro.
Apesar de diferentes entre si,
as experiências amorosas são
processos solitários -que reverberam na cidade desabitada- e se revelam frustrantes.
O
amor é como uma febre, uma
insolação, que também é vivido
como perda. Os diálogos são
frequentemente teatrais e literários, distantes de qualquer
matriz realista, conferindo ainda mais estranhamento a essas
figuras desesperadas.
Longe dos cânones cinematográficos, ousado em sua proposta, "Insolação" é um filme
exigente para o espectador ao
trabalhar as emoções de maneira contida, sem convencionalismo. Solicita olhos e ouvidos atentos e coração aberto.
INSOLAÇÃO
Direção: Daniela Thomas e Felipe
Hirsch
Com: Paulo José, Simone Spoladore, Leonardo Medeiros
Produção: Brasil, 2009
Onde: Frei Caneca Unibanco Arteplex 5
Classificação: livre
Avaliação: bom
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