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COMENTÁRIO
MinC engole sapo e só faz mudanças superficiais
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DA ILUSTRADA
O arquivamento da proposta de encaminhar ao
Congresso um projeto de mudança do regime de incentivo fiscal à
cultura foi um dos sapos que o
Ministério da Cultura engoliu e
uma das promessas que deixou de
cumprir. A cúpula do MinC, que
mal consegue impor mudanças
cosméticas à lei por meio de um
decreto, diz que as alterações serão propostas na "próxima gestão". Ou seja, entregou a Deus.
É claro que a Lei Rouanet beneficia a cultura. Os recursos que ela
permite aplicar dinamizam a atividade cultural. Mas isso não significa que a legislação seja a mais
adequada. Mesmo o mais aleatório dos critérios faria com que a
distribuição de R$ 677 milhões ao
meio cultural -foi essa a renúncia fiscal em 2005- produzisse
frutos. E certamente muitos, em
especial os que colheram esses
frutos, acenariam com os resultados para justificar a manutenção
dos critérios -por mais precários que fossem.
De certa forma, é o que vem
acontecendo com o incentivo à
cultura. A Lei Rouanet encerra
contradições flagrantes em se tratando de uma legislação destinada a incentivar o investimento
privado em projetos culturais por
meio de apoio financeiro público.
Na prática, o que temos são
companhias privadas (e também
públicas) "investindo" impostos
(que seriam recolhidos pelo Estado) a seu bel prazer ou em atendimento aos lobbies com mais força
política ou socialmente mais bem
posicionados para convencer as
cúpulas empresariais.
Mais do que isso, temos uma série de institutos, bancados por intituições financeiras extremamente lucrativas, que associam
suas marcas ao investimento ou
ao mecenato cultural embora, na
realidade, pratiquem essas virtudes (exploradas no marketing)
com dinheiro de tributos.
Em resumo, temos dinheiro público alocado por empresas privadas, de acordo com seus interesses. Mas -diga-se- nada disso
seria possível sem o indispensável
aval do Minc, que autoriza "captações" mesmo em casos nos
quais o mercado parece perfeitamente capaz de arcar com o empreendimento.
A idéia de investimento -ou
seja, de um capitalista que assume
o risco de destinar recursos a um
projeto que presumivelmente lhe
trará retorno- se dissipa na confusão público-privado, como é
comum no Brasil. Ficamos com
investidores privados que correm
pouquíssimo ou nenhum risco
-pois estão cobertos por recursos da sociedade. Por que desejariam mudar a lei?
Já se formulou, e o próprio
MinC em tese assumiu, a idéia de
concentrar o montante da renúncia fiscal num fundo público que
distribuiria os recursos segundo
critérios estabelecidos por uma
política de Estado. Mesmo que
critérios públicos também possam ser problemáticos, é uma discussão pertinente, que deveria ser
apresentada ao Congresso. Foi o
que o MinC não fez.
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