São Paulo, Quarta-feira, 26 de Maio de 1999
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Reginaldo Rossi, o Roberto Carlos nordestino, ganha o sul


Até há pouco confinado ao sucesso localizado no Nordeste, cantor popular vira tema de tributo pop e tem dez álbuns gravados entre 1976 e 1989 relançados em CD


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
enviado especial a Recife

Roberto Carlos é rei, mas não é o único. Sitiado numa casa-escritório à beira da praia na região metropolitana de Recife (PE), Reginaldo Rossi, 54, é, para os fãs que o rodeiam na terra em que nasceu e onde vive, o rei, o "rei do norte".
Num microcosmo que apenas há poucos meses começa a voltar aos ouvidos do Sul e do Sudeste do Brasil, ele goza, perdido no tempo e, quase, no espaço, de fama e fortuna comparáveis às que Roberto Carlos conquistou ao dirigir a saga da jovem guarda, entre 63 e 68.
De volta às paradas por causa de disco de "greatest hits" gravado ao vivo e lançado pela Sony no ano passado -e que vendeu, segundo a gravadora, 300 mil cópias-, vê agora dez de seus velhos LPs -um de 1976, os outros todos dos anos 80- chegarem ao formato CD, em coleção de preços populares lançada pela EMI.
Identificado com o ideário brega, fazia nos 60 e 70 -e ainda faz hoje- jovem guarda como Roberto desistiu de fazer desde 68. E, de forma análoga, vê sem querer sua música se tornar, enquanto continua "brega", objeto de culto.
O culto é tal que está em preparo o tributo "Reiginaldo Rossi", em que expoentes recifenses de mangue beat, como Mundo Livre S/A e Otto, e artistas nordestinos como Zé Ramalho, Geraldo Azevedo e Lenine (leia quadro) se atiram ao universo do cantor e compositor.
O CD, produzido por Zé da Flauta para o selo independente recifense Mangroove, está programado para setembro. "Ele é um ícone, o artista do showbizz pernambucano que mais fatura. Escuto desde que tinha 15 anos. Rei, aqui em cima, é ele", justifica o dono do selo, Paulo André, 31.

Ascensão, queda, ascensão
Mais que dar continuidade ao mito da jovem guarda, Reginaldo engordou suas fileiras desde o início. "Fiz o primeiro conjunto de rock do Nordeste, The Silver Jets, em 64. Aí, comecei a cantar sozinho", lembra.
A identidade com o outro rei vem de lá. "Fiquei conhecido como o Roberto Carlos do norte. Não que fosse, mas fazia aqui um movimento parecido com o dele. Ele vinha para cá, e eu abria seus shows. Um dia, seu empresário me disse: "Garoto, se você for para São Paulo, eu cuido da sua carreira". Fui."
Em 67, em São Paulo, gravou seu primeiro LP, já como um Roberto Carlos à nordestina. A diferença: enquanto seu modelo decidiu, em 68, aposentar o iê-iê-iê e se tornar ídolo romântico, Reginaldo manteve-se fiel ao gênero. "Era tudo romântico também, mas sempre fui roqueiro. Sou o roqueiro romântico. E sou brega, no sentido de ser o povo, popular", define-se.
A divisão entre o brega e o chique, segundo ele, se intensificou naquela época. "A divisão começou quando a jovem guarda acabou. A revolução estava muito presente, nós não tínhamos corrente política nenhuma. Bacana era cortar o saco do general, mas éramos todos garotos, nem sabíamos o que estava acontecendo. Fomos considerados alienados."
Roberto Carlos, à época, se disse de direita, e ele? "Sempre fui anticomunista radical. Também era de direita. Ainda sou", responde.
Foi na fase pós-jovem guarda, primeira metade dos 70, que gravou vários de seus hits -"Mon Amour, Meu Bem, Ma Femme", "Tô Doidão", "O Rock Vai Voltar", "O Gênio Cabeludo" (em que "conversa" com Beethoven).
Ele decupa sucessos como esses: "Eu canto o brega-chique. Comecei a fazer engenharia, falo várias línguas, faço canções populares com concordância bem-feita. Não sou trouxa".
Ficou em São Paulo, segundo ele, até surgir "a história de que tinha que haver cantor de FM e cantor de AM". "Virei cantor de AM, aí diminuiu minha promoção. FM era a moda, queriam que eu me sofisticasse para tocar em FM."
Voltou a Pernambuco em 80 e lá se fixou. "Pensei: vou para Recife trabalhar na minha terra, junto a meus entes mais próximos e queridos." De lá, gravou pela EMI, mas com sucesso mais modesto.
A caminho da casa de Reginaldo, o taxista que conduz a reportagem divaga sobre essa fase: "Ele é meu ídolo. Quando estava caído, levei muito ele para cantar em circos. Nunca perdeu a humildade".
O grande sucesso desse período é "Garçom" (87), hoje também promovido a objeto de culto. Nos 90, lançou discos independentes pela Polydisc, um selo de Recife.
Como a Polydisc é distribuída pela Sony, acabou sendo redescoberto por uma multinacional, que colocou em circulação nacional seus CDs mais recentes.
A vendagem inesperada de "Grandes Sucessos ao Vivo", do ano passado, ofuscou colegas da Sony como Daniela Mercury e Skank. "Possivelmente não seja o cantor Reginaldo Rossi, mas a figura. As pessoas comentam que sou um fenômeno. Agora explodiu, a mídia do Sudeste está me procurando muito. Antes ficava só o povo sabendo."
"No ano passado, pedi de joelhos para sair da Sony. Lançavam meus discos, mas não mostravam no sul. Foi uma surpresa para eles o sucesso. Agora meu contrato é diretamente com a Sony."

Paródia?
Com trejeitos mais à moda de Roberto Carlos -seu colega de gravadora- do que nunca, Reginaldo ainda enfrenta a suspeita de ser sua paródia.
"Não parodio Roberto Carlos. Talvez meu sucesso se deva a isso: ele tendeu a outra vertente, eu continuo aquele garotão da jovem guarda, aos 54 anos. Ele foi virando um senhor, virou avô, eu continuei sendo garotão."
Fala mais: "Roberto é o meu ídolo. Ele é rei não em Recife, mas no Brasil todo. Ele é o rei dos reis. Eu sou o rei dos bregas. Estou mais popular que ele, mas ele é tão bom que se fizer um disco popular vende 8 milhões de cópias".
Reginaldo Rossi gostaria de ser Roberto Carlos? "Não. Não queria ser o Michael Jackson, nem o Bill Gates. Quero ser o Reginaldo Rossi, o velho Reginaldo Rossi."


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