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Inglês quer ver moda criativa em SP
DARIO CALDAS
ESPECIAL PARA A FOLHA
O escritor e jornalista inglês Collin McDowell respondeu por fax
às perguntas da Folha, de seu escritório em Londres, logo depois
de ter chegado da temporada de
moda de Sydney, na Austrália.
McDowell está fazendo a curadoria de uma retrospectiva do estilista John Galliano e chega a São
Paulo amanhã, para os desfiles.
Folha - O sr. acha possível comparar a ascensão de São Paulo como
capital de moda com o que aconteceu com Milão, nos anos 70 (quando a indústria da moda local teve
de implantar a temporada em Milão para fazer frente ao prêt-à-porter francês)?
Collin McDowell - É cedo demais
para posicionar o valor do Brasil
nos termos da moda italiana, e eu
particularmente ainda não vi a
moda brasileira. Entretanto, os
relatos que ouço são bem encorajadores -e, lembre-se, o "milagre" da moda italiana dos anos 70
levou dez anos para acontecer.
Folha - O que faz de uma cidade
uma capital da moda?
McDowell - As modernas capitais fashion devem ter talentos,
uma boa infra-estrutura de mídia
e negócios, um treinamento de
moda forte e programas de educação. Um estilo de vida que encoraje uma maneira estilosa de viver (lojas modernas, restaurantes,
clubes e festas de gala) e uma classe média capaz de ter o suficiente
para gastar em roupas e num estilo de vida "fashionable". No momento, somente Nova York tem
todas essas características, mas isso não impede que outras cidades
(que tenham pelo menos algumas
dessas coisas) sejam fortes -e isso inclui o Brasil. Uma moderna
capital fashion precisa de tipos diferentes de design, mas precisa ter
pelo menos um grande talento.
Folha - O sr. vê uma ruptura entre
"roupas para serem vistas" e "roupas para serem usadas". Dessa
perspectiva, quais são as funções
da vanguarda da moda, hoje?
McDowell - A função da moda de
vanguarda, nos dias de hoje, é a
mesma de sempre: chocar, surpreender, causar prazer e amedrontar o resto de nós com sua
originalidade. Ela deve prover
idéias que outros possam usar para fazer roupas usáveis e bonitas.
Um verdadeiro estilista é como
um artista: ele está sempre atento
ao que os outros estão fazendo,
mas nunca os copia.
Folha - O sr. definiu a moda da seguinte maneira: "A moda tornou-se importante como um catalisador
que torna possível o desenvolvimento em muitas áreas. (...) A moda tornou-se a força criativa que
mais influencia a todos nós". Nesse
sentido, o sr. concorda que o jornalista de moda tem uma séria responsabilidade? Como o sr. define o
crítico de moda?
McDowell - Os jornalistas de moda deveriam ter um papel muito
sério mas, de fato, esse papel está
sendo diminuído porque os seguidores da moda estão mais interessados em imagens do que em
palavras; os estilistas não gostam
de ser criticados (mesmo quando
de maneira construtiva); e editores de jornais e revistas vêem a
moda como algo desimportante,
ou de exclusivo interesse para
mulheres. As coberturas de moda
de jornais e revistas são frequentemente superficiais e bobas porque é isso o que a maioria dos leitores quer. A prova de decadência
da cobertura de moda é constatada, por exemplo, pela obsessão da
mídia por "celebridades".
Folha - Quando o sr. vê um novo
"jovem criador", o que diferencia
um estilo criativo e promissor de
uma estéril excentricidade?
McDowell - Raramente vejo o
desfile de um novo estilista até
que ele tenha produzido um ou
dois desfiles, porque acho que o
talento precisa ser desenvolvido
com o tempo. Infelizmente, os estilistas sentem a necessidade de
conseguir manchetes de jornal
muito cedo em suas carreiras, então eles tendem a tentar ser memoráveis através do choque. Por
sorte, as únicas pessoas que podem realmente construir um nome são os críticos que se sentam
nas primeiras filas dos desfiles.
Como eles já viram tudo, não ficam facilmente chocados e podem separar rapidamente os dublês baratos dos talentos de verdade. No fim, o talento tem por
base a inteligência e, quando se
tem alguma coisa única a dizer, isso se torna claro muito rapidamente.
Folha - O sr. certamente conhece
alguns estilistas brasileiros e tem
algumas informações sobre a moda local. Então, o que o sr. espera
ver no Brasil?
McDowell - Espero que a moda
do Brasil seja excitante, inteligente e que reflita o estilo de vida e da
cultura do país, sendo diferente
do que encontramos na Europa e
em Nova York. Se não for diferente conceitualmente, para que existiria, então? Globalmente, já vimos muitos talentos. O Brasil poderá servir como centro de moda
somente se encontrar algo único
para trazer ao mundo. Espero e
conto com isso.
Folha - O seu conselho para os designers brasileiros que desejam ter
uma presença internacional?
McDowell - Eles devem criar algo
único para si próprios, devem resistir à tentação de imitar os estilistas europeus, como Alexander
McQueen e John Galliano, e devem ter orgulho em refletir a cultura de seu país. Acima de tudo,
devem perseguir seus sonhos e
tentar não se comprometer.
Folha - O último evento revolucionário da moda, na sua opinião,
foi o uso de calças pelas mulheres,
nos anos 40. Para alguém que já viu
quase tudo, como o sr., existe algo
realmente novo no ar?
McDowell - O motivo pelo qual
nunca fiquei entediado com a
moda é que sempre existe algo de
novo no ar, mesmo que seja raramente radical e difícil de atingir,
como quando as mulheres adotaram as calças compridas. A área
que considero que será realmente
revolucionária nos próximos
anos é a que vai redefinir a sexualidade masculino/feminino, mas
não tenho idéia do que será. Só os
estilistas sabem.
Dario Caldas é sociólogo e doutorando
da École des Hautes Études en Science
Sociales de Paris
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