São Paulo, terça-feira, 26 de junho de 2001

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Teatro Olímpico

Uma das principais atrações da Olimpíada Teatral de Moscou, Tadashi Suzuki une drama clássico japonês à tragédia grega

Keizo Yamaguchi/Divulgação
O personagem Jocasta (à frente), em cena de "Édipo Rei", espetáculo de Tadashi Suzuki apresentado em Moscou; no palco, o diretor desenvolve método de interpretação combinando técnicas teatrais


MARCIA VINHA
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM MOSCOU

Uma das participações mais esperadas na 3ª Olimpíada Teatral Internacional, que há dois meses ocorre em Moscou, foi a do diretor japonês Tadashi Suzuki.
Mestre em uma abordagem dramática que une o drama clássico japonês à tragédia grega, sua mais importante contribuição ao teatro contemporâneo é alterar o ponto de referência tradicional como se concebe a tragédia grega: o gênero milenar torna-se veículo para o diretor transmitir sua própria filosofia. Tradicionalmente, a tragédia é a mensagem principal da peça, o que ainda ocorre, mesmo em produções de vanguarda.
No Japão, Suzuki dirige a Companhia de Toga (SCOT), que influencia a renovação das artes cênicas internacionalmente. Já em 1966, o diretor desenvolvia exercícios sistemáticos de treinamento do ator, batizados de "Método Suzuki de Interpretação": uma combinação de técnica e filosofia teatrais. Orientado pela sua formação sociológica e oriental, o método enfatiza a "energia animal" do ser humano como grande força de expressão e considera que o teatro possui importância social e espiritual determinantes para a situação política global.
Suzuki dirige o Centro de Interpretação de Shizuoka, onde em 99 ocorreu a 2ª Olimpíada Teatral Internacional. Ao lado de Antunes Filho, Robert Wilson e Tony Harrison, entre outros, é membro do Comitê Internacional do evento. Dentre seus mais aclamados espetáculos, representados internacionalmente, estão os clássicos gregos "Mulheres de Tróia" (77) e "Dionisius" (93).
Em Moscou para apresentar as tragédias "Electra" e "Édipo Rei", ele falou à Folha.

Folha - A 3ª Olimpíada Teatral Internacional reavalia a produção das artes cênicas do século passado e apresenta vertentes para o este milênio. O que se pretende com um acontecimento dessas proporções?
Tadashi Suzuki -
Depois da Guerra Fria ainda existem inúmeros conflitos regionais pelo mundo, de fundo religioso, político e social. Por isso, as grandes figuras do teatro internacional decidiram que poderiam fazer algo para ajudar as pessoas a coexistir um ao lado do outro e em paz. Esse é o grande propósito das Olimpíadas.

Folha - O objetivo é muito mais uma proposta à solução dos conflitos no mundo de hoje do que mais um exercício de reflexão teatral?
Suzuki
- Pode-se dizer que sim, mas ambas as coisas estão intimamente ligadas. Nós estamos insistindo na solução para os conflitos, isso é fundamental. A resolução dependerá mesmo dos políticos, mas cabe a nós sugeri-la.

Folha - Atualmente há uma tendência em reavaliar os clássicos. O senhor faz isso tanto com a tragédia grega como com o drama japonês e é aclamado pela harmonia com que consegue unir os dois gêneros. Como vê as montagens ocidentais da tragédia grega?
Suzuki
- Eu acho que o modo como se trabalha a tragédia grega na Europa, por exemplo, é incompatível à tragédia. O meu modo oriental de tratá-la é diferente.

Folha - Mas a tragédia grega é um gênero ocidental. A mentalidade ocidental não consegue reproduzi-la de maneira adequada?
Suzuki
- Não. Porque os diretores europeus não dão muita atenção à atuação dos atores. O atuar não é adequado. E o principal na tragédia grega é atuar. O modo de atuar europeu é muito realista, muito naturalista.

Folha - Eles prestam atenção a que?
Suzuki
- À imagem desta ou daquela produção, aos comentários etc. Mas não prestam atenção à atuação. O recurso que possuem do palco, do ponto de vista da energia animal, não é suficiente.

Folha - Que diretores europeus pecam na interpretação da tragédia?
Suzuki
- Todos, quase todos. Aos poucos vejo uma nova tendência de tratar esse gênero, mas ainda é pequena, sobretudo na Europa.

Folha - Em outros trabalhos, o senhor reavaliou a tragédia grega relacionando o peso da história coletiva e da individualidade humana solitária. Ambientou suas peças em hospitais. Por que estamos todos em hospitais?
Suzuki
- Eu represento isso em "Electra". Porque acredito que as agonias que um paciente passa no hospital, sua destituição espiritual é uma situação da qual não podemos nos libertar e um fato ligado a todos os tempos, raças e costumes. A criatura humana não está imune a viver uma barbárie numa vida enlouquecedora.


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