São Paulo, terça-feira, 26 de junho de 2007

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Caso de polícia

Correspondente vê a banda (que continua brigando) em Los Angeles e diz que "é como voltar a fumar ou andar de bicicleta"; os fãs adoram

SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A LOS ANGELES

Quem ainda precisa de Police?
No sábado, fui assistir à etapa de Los Angeles da atual turnê de reunião do trio pensando no título da Ilustrada de 19 de março ("Police para quem precisa", uma brincadeira com a música dos Titãs), que anunciava a volta em comemoração dos 30 anos da banda.
Aparentemente, não o próprio trio. Segundo relatos de pessoas que acompanham a banda desde a reunião, no começo do ano, assim que voltaram a ensaiar, em Vancouver, no Canadá, as tensões que levaram o líder (e baixista) Sting, o baterista Stewart Copeland e o guitarrista Andy Summers a se separar prematuramente, 23 anos atrás, voltaram junto.
Depois do segundo show, ainda em Vancouver, no mês passado, Copeland escreveu em seu blog: "Isso é absolutamente vergonhoso. Nós somos os poderosos Police e estamos completamente perdidos". Faria ainda uma crítica feroz e completa à apresentação, apontando erros técnicos, desafinadas do vocalista e más escolhas musicais.
O criador do que viria a ser uma das bandas de rock mais influentes dos anos 80 foi também sempre um de seus maiores críticos. Tornaram-se históricos os bate-bocas entre esse norte-americano de 54 anos, filho de um ex-funcionário da CIA, e o ex-professor britânico Gordon Matthew Sumner, também conhecido como Sting ("ferrão"), 55, com o também britânico Andy Summers, 64, tentando apartar os dois.
Quem ainda precisa de Police?
Os três estão bem financeiramente, Sting à frente, sendo o que se deu melhor na carreira solo. Mas nenhum se encontra mais no auge. E o verdadeiro dinheiro da indústria musical hoje vem dos shows ao vivo. A venda de CDs nos EUA caiu de 785 milhões de unidades em 2000 para 588 milhões no ano passado; no mesmo período, o faturamento da indústria mundial foi de US$ 36,9 bilhões para US$ 31,8 bilhões.
Quem não faz shows não fatura. Seria essa a (única) explicação da volta? Aos poucos, os fãs vão chegando ao estádio do time de beisebol Dodgers, no centro de Los Angeles, e lotando os 56 mil lugares. Fiction Plane, a banda de abertura que é um caso flagrante de nepotismo (Joe Sumner, filho de Sting, é o líder), já se apresentou -e não mudaria os rumos da noite ou do rock.
Agora, Dave Grohl grita os versos de "Best of You", música que o ex-Nirvana compôs para o quinto álbum de sua banda, Foo Fighters, a segunda a se apresentar na noite de hoje. Enquanto isso, quarentões e cinqüentões que mostram na cabeça os sinais da batalha entre pele e pêlo começam a se acomodar nas cadeiras.

Poucas alterações
Então, às 21h10, um gongo e os primeiros acordes de "Message in a Bottle": "Just a castaway/an island lost at sea-ô". É como voltar a fumar ou andar de bicicleta. Reaparece tudo que esteve sempre ali, adormecido. Os versos terminados em "ô", os "i-ô-ô", "i-ô-ô". O vocal metálico, pouca coisa mais aveludado nas bordas devido aos anos.
Serão quase 30 músicas, que o trio faz o favor de não "desconstruir" muito e tocar mais ou menos como as originais. Quando muda, geralmente é para melhor. Vem "Sinchronicity II" ("Many miles away/Something crawls from the slime/At the bottom of a dark/ Scottish lake -Scottish laaaaaake!"). Sting em melhor forma que 90% do público.
"Walkinkg on the Moon" ("Some/ may say/I'm wishing my days away/No way"), o sotaque forçado (jamaicano? de alguma das ilhas?), a batida ska de Copeland imitada à exaustão até hoje e que levou muita gente boa a dizer que os Paralamas eram o Police brasileiro.
"Voices Inside My Head", que começa com um baixo que lembra o de "Maracatu Atômico" a esse brasileiro, com Sting sendo um baixista melhor do que era e a guitarra de Summers, menos dura. O susto de "Don't Stand So Close to Me" modificada, uma das únicas da noite. Os primeiros fãs começando a sentar, pois ninguém é (mais) de ferro.
"Every Little Thing She Does Is Magic" ("everylittle, everylittle, everylittlethingshedoes!" e no final "is magicmagicmagic, magicmagicmaaagic, i-ô-ô, i-ô-ô, i-ô-ô-ô-ô-ô..."). Há dois momentos Raoni ("Walking in Your Footsteps" e "Wraped Around Your Finger"), o arrepio de lembrar que pós-Police Sting teve a fase "world music".
Mas tudo logo passa com "Roxanne", numa versão melhor que a tocada nos Grammys, "Can't Stand Losing You", "King of Pain" ("There's a little black spot on the sun todaaaaay", o "todaaaaay" com toda a melancolia possível).
Quem ainda precisa de Police? Talvez a resposta esteja no mesmo post que Copeland escreveu em seu blog ainda em Vancouver. "Dane-se, é apenas música." E os fãs gostam.


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