|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Latinos debatem uma Macondo em ruínas
Em Paraty, autores se confrontarão mais uma vez com o insepulto realismo mágico
Rodrigo Fresán, Alan Pauls, Guillermo Arriaga, Ignacio Padilla e Cesar Aira estão em encontro; para Padilla discussão já cansou
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
Quando os novos autores latinos convidados para a Festa
Literária Internacional de Parati forem fatalmente questionados sobre a tão alardeada
morte do realismo mágico, estarão falando de um cadáver insepulto há ao menos 11 anos.
Desde 1996, data da publicação da coletânea "McOndo"
(ed. Mondadori), organizada
pelos chilenos Alberto Fuguet e
Sergio Gómez, uma nova geração de autores, especialmente
do Chile, da Colômbia, do México e da Argentina, tem confrontado o gênero que até então
definira as letras do continente,
principalmente depois do chamado "boom" dos anos 70.
O título do livro faz um trocadilho entre Macondo, nome da
cidade onde se passa o romance
"Cem Anos de Solidão", de Gabriel García Márquez, e a rede
de lanchonetes McDonald's.
A idéia inicial foi romper com
a tradição latino-americana em
três níveis. Primeiro, tratava-se
de desconstruir o universo mítico e fantasioso inaugurado
por García Márquez e explorado à exaustão por seus seguidores. Depois, acabar com a vinculação entre literatura e um
projeto de esquerda considerado ultrapassado. E, por fim, deixar de evocar tradições indígenas ou paisagens nacionais estereotipadas para a ambientação dos romances.
A geração do então batizado
"realismo urbano" surgia assim
menos política, mais multiculturalista, metropolitana e livre
para escrever histórias que se
passassem em qualquer lugar
do tempo e do espaço.
Os tempos de "diversidade
cultural", porém, falaram mais
alto, e hoje poucos admitem
que exista um projeto literário
homogêneo. "Houve um exagero por parte da mídia ao reforçar esse rótulo de realismo urbano. Nunca me senti sendo
contra nada nem ninguém,
muito menos contra o García
Márquez. Apenas acho que um
escritor deve poder imaginar
tramas que não se passem necessariamente no lugar em que
vive", disse à Folha o argentino
Rodrigo Fresán, um dos autores que estavam na coletânea
organizada por Fuguet e que
integrará a mesa "De Macondo
a McOndo" com o mexicano
Ignacio Padilla, no encontro
em Paraty (de 4 a 8 de julho).
Integrante da geração
"Crack" -uma espécie de braço mexicano do "realismo urbano"-, Padilla concorda que a
discussão sobre o fim do realismo mágico já cansou, mas pode
alimentar debates.
Em seu manifesto de fundação, também de 1996, o grupo
"Crack" pedia mais "complexidade" para a narrativa mexicana e estimulava a variedade no
que diz respeito à localização
geográfica das histórias.
"Conversar com Fresán será
ótimo, porque creio que ele e
eu somos os que defendem
mais ao extremo a idéia de uma
literatura feita aqui, mas que
seja internacional", disse.
Os mais recentes romances
de Padilla, "Amphytrion" e
"Espiral de Artilharia", se passam durante a Segunda Guerra
e o período da desconstrução
do projeto soviético. Já Fresán
mistura Londres nos "swinging
sixties" e a era vitoriana, em
"Jardins de Kensington".
"O internacionalismo é o aspecto mais comum à nova geração, ainda que relacionado de
alguma forma a nossos países",
diz Padilla. "No meu caso, tratei do fim do totalitarismo soviético para pensar os estertores do governo PRI (Partido
Revolucionário Institucional),
no México, em 2000.
O argentino Cesar Aira também não gosta de ouvir falar
em rótulos. "A literatura é algo
muito individual. Grupos e tendências não servem para nada.
Esses agrupamentos são invenção de críticos e jornalistas culturais. Comprovo isso sempre
que me colocam em alguma lista", diz. Na Flip, Aira vai debater ensaio e ficção com o brasileiro Silviano Santiago. O escritor também vai ler trechos da
coletânea de ensaios "Pequeno
Manual de Procedimentos".
Violência e amor
O autor dos roteiros de "Babel" e "Amores Brutos", fenômenos recentes do novo cinema latino-americano, Guillermo Arriaga mostrará seu lado
romancista na Flip. O universo
de mortes violentas, prostitutas e assassinos de seus filmes é
o mesmo que povoa sua ficção.
E, por mais atual que tudo possa parecer, Arriaga se sente devedor da tradição literária mexicana. A relação dos personagens com um deserto fundacional lembra os enredos de Juan
Rulfo (1917-1986), em obras como "Pedro Páramo".
Completa o time dos latinos
o argentino Alan Pauls. Até
pouco tempo editor do suplemento cultural do irreverente
jornal "Pagina 12", o autor de
"O Passado" -romance filmado por Hector Babenco e previsto para estrear em outubro-
vem conversar sobre o amor
com a psicanalista Maria Rita
Kehl (a programação do evento
está em www.flip.org.br).
Texto Anterior: Cecilia Giannetti: Considere este post Próximo Texto: Frases Índice
|