São Paulo, sábado, 26 de junho de 2010

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CRÍTICA DVD

Comédia alia classe à arte de mostrar e ocultar no cinema

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

No início de "Irene, a Teimosa", duas irmãs ricas e fúteis tentam levar o sem-teto Godfrey (William Powell) para sua mansão: trata-se de uma das tarefas da gincana que reúne ricos e fúteis em que se acham envolvidas.
O sem-teto é o objeto da disputa entre as irmãs. O começo desta comédia "screwball" de Gregory LaCava de certo modo situa sua época.
Foi feita em 1936, na Depressão, quando o cinema costumava ver os ricos como incapazes de perceber em seus semelhantes algo que não objetos de exploração.
Logo depois também podemos compreender por que o termo "screwball comedy" foi tão bem traduzido no Brasil como comédia maluca, de personagens excêntricos.
Isso fica mais claro depois que Godfrey aceita tornar-se mordomo da família, movido um tanto por necessidade e outro tanto pela simpatia por Irene (Carole Lombard).
O mordomo se mostrará um homem sábio que consegue conviver com mulheres mimadas, ciumentas, cheias de luxo (mãe e duas filhas).
Ele ensinará aos espectadores isto que hoje as novelas popularizaram: o dinheiro não torna ninguém melhor.
Mas Godfrey o faz com uma classe que poucos outros personagens fariam.
É isso que nos prende ao filme: não importa tanto saber se ele ficará com Irene ou não. Nossa desejo é descobrir quem, afinal, Godfrey é.
Pois, quando ele aparece pela primeira vez, num barraco, é fácil designá-lo: sem-teto, vagabundo.
Com o tempo, quanto mais o conhecemos, mais ele se torna opaco: seria um livre-pensador, um etnólogo?
Eis a arte que faz deste filme um clássico: a de a um só tempo mostrar e ocultar, jogar os elementos na mesa e abri-los minuciosamente, de tal modo que, ao final, mostrar e demonstrar parecem uma coisa só. É o momento em que saberemos quem são Godfrey, Irene e os outros.


IRENE, A TEIMOSA

DISTRIBUIDORA Platina
QUANTO R$ 35
CLASSIFICAÇÃO livre
AVALIAÇÃO ótimo



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