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CINEMA/ESTRÉIAS
"A COR DO PARAÍSO"
Obra representa um retrocesso na produção do país
Com austeridade, iraniano dá vazão aos sentidos
CRÍTICO DA FOLHA
Já em "Filhos do Paraíso", o diretor Majdi Majidi tendia um
pouco menos para o anedótico e
um pouco mais para o sentimental do que parecia permitir o tom
habitual do novo cinema iraniano. A indicação ao Oscar de filme
estrangeiro caía-lhe como uma
luva.
Em "A Cor do Paraíso", o sentimentalismo potencial da situação
de que parte o cineasta chega a
lembrar o velho cinema comercial
iraniano. Mas, se o sentimentalismo permanece potencial é porque Majidi demonstra, mais uma
vez, ter tirado suas lições do sucesso internacional da escola que
hoje podemos denominar de
"neo-realismo iraniano", pilotada
por Kiarostami, Makhmalbaf e
discípulos (ex-assistentes) como
Jafar Panahi e Bahman Ghobadi.
É em momentos assim, em que
se revela capaz de disciplinar, por
um método de filmagem de austero realismo, diretores com nítidas tendências comerciais como
Majidi e histórias de índole melodramática, que a escola iraniana
prova a sua força. Em "A Cor", essa austeridade do método impede
que o filme, a história de uma
criança cega enjeitada pelo pai e
protegida pela avó religiosa, descambe para o sentimentalismo.
Em vez de reforçar a dramaticidade da situação de que parte,
Majidi prefere deixar a trilha sonora e o perfil psicológico dos
personagens de lado para dar vazão aos sentidos, forjando um
"filme de percepção" ao requentar a proposição que Makhmalbaf
lançou em "O Silêncio": tomar
uma criança cega para realizar
uma obra de signos sonoros.
Houve uma época em que uma
geração do cinema iraniano foi
condenada a realizar filmes pedagógicos. Fazer filmes com crianças era uma forma de fugir da
censura. Nos anos 90, com o
abrandamento do regime islâmico, uma outra geração pôde fazer
da criança a personagem ideal de
uma nova percepção de mundo
que nascia. No "espírito da infância", com signos óticos e sonoros
puros, essa geração encontrou, a
exemplo dos neo-realistas italianos, manancial para a criação de
uma nova cinematografia.
Majidi retoma a perceptividade
para usá-la como um recurso
poético. Ele é mais bem-sucedido
quando se detém na relação tátil
do protagonista com a natureza,
filmando as mãos da criança, como fizera na única passagem memorável de "Filhos do Paraíso".
"A Cor do Paraíso" representa
um retrocesso da cinematografia
iraniana não apenas por retomar
o mote da percepção infantil numa fase em que o cinema iraniano, passando da percepção à
ação, começa a eleger a mulher
como sua nova protagonista
ideal, heroína desprivilegiada de
um país semidemocratizado.
O retrocesso do filme está em
seu fundo religioso e na consequente visão moralista em que o
cineasta, contradizendo suas próprias opções metodológicas, acaba por encerrar as personagens. (TIAGO MATA MACHADO)
A Cor do Paraíso
Rang-e-khoda
Direção: Majdi Majidi
Produção: Irã, 1999
Com: Hossein Mahjub, Salame Feizi
Quando: a partir de hoje no Top Cine
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